[Evento] Filosofia e Eco-Anarquia em Tempos de Pandemia (LIVE), Casa de Vidro, Goiânia, dia 8 de Maio, 19h.

O eco-anarquismo ou anarquia verde é uma filosofia política anarquista com ênfase na questão ambiental. Como outras correntes anarquistas, o eco-anarquismo parte de uma crítica socialista e libertária ao capitalismo e toda forma de autoritarismo. Seu diferencial é abordar a questão ecológica como questão central ao invés de secundária, compreendendo os problemas ecológicos como inseparáveis das questões sociais e por isso igualmente urgentes.

No dia 08 de Maio, sexta-feira, a partir das 19h, A Casa de Vidro (www.acasadevidro.com), em parceria com a Editora Monstro dos Mares (https://monstrodosmares.com.br/) e o Grupo de Estudos em Complexidade, promovem o webdebate “Filosofia e Eco-Anarquia em Tempos de Pandemia” com Janos Biro Marques Leite, Pedro Tabio, Renato Costa e Eduardo Carli de Moraes. Assista ao vivo pelo Canal do Youtube d’A Casa de Vidro: https://youtu.be/yo-jeN2aPtE.

Introdução

Combinando a crítica anarquista ao Estado e ao Capital com uma perspectiva ecocêntrica vinda do veganismo, do primitivismo, da crítica à sociedade industrial ou da ecologia profunda, a filosofia eco-anarquista tem se mostrado uma fonte valiosa de reflexões e provocações para o contínuo desenvolvimento das teorias e práticas anarquistas, desafiando os paradigmas das escolas de pensamento mais tradicionais.

São consideradas como ligadas ao eco-anarquismo as seguintes tendências: o anarco-naturismo (inspirado por Thoreau, Tolstoi e Élisée Reclus), a ecologia social (que não se limita ao movimento iniciado por Bookchin), o anarcoprimitivismo (representado por John Zerzan e os autores da revista Green Anarchy) e o veganarquismo (movimento anarquista e vegano).

O anarcoprimitivismo e o veganarquismo se destacam em tempos de pandemia pela crítica que já faziam há muito tempo à sociedade de massas e à domesticação de animais como fatores da produção de pandemias e novas doenças. (Janos Biro)

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“Pandemia constitui um reflexo cabal da miséria do capitalismo” — Entrevista com Carlos Taibo

Nosso compa Raphael Sanz, jornalista e editor-adjunto do Correio da Cidadania, entrevistou o professor, autor e pensador Carlos Taibo. Seu livro “Colapso: capitalismo terminal, transição ecossocial e ecofascismo” tem levantado questões significativas sobre o nosso tempo e o que está por vir. Nossos agradecimentos ao Raphael por compartilhar a entrevista conosco, valeu mano!


“Pandemia constitui um reflexo cabal da miséria do capitalismo”

A pandemia do Coronavírus se expande por todo o planeta e seus efeitos já são sentidos e temidos. Enquanto vemos o provável colapso dos sistemas de saúde em nível mundial somados a problemas ambientais e sociais preexistentes, os discursos políticos e midiáticos oficiais recusam qualquer debate relativo a um eventual colapso do sistema que venhamos a testemunhar – mas a possibilidade existe. Sobre esse contexto entrevistamos Carlos Taibo, professor de Ciência Política da Universidade Autônoma de Madrid, autor de diversos livros sobre o tema, entre eles Colapso: capitalismo terminal, transição ecossocial e ecofascismo, lançado no Brasil pela Editora UFPR no ano passado.

“Salta à vista que o capitalismo pretenda não dar um passo atrás. A morte de muitos seres humanos, sobretudo idosos, é vista como um problema menor em comparação com a manutenção da lógica do trabalho assalariado, da mais-valia e da mercadoria. Por trás desponta, como sempre, a subordinação dos governos, dos Estados, aos interesses de poderosas corporações econômico-financeiras que operam nos bastidores. E se faz evidente que a crise tem uma manifesta condição de classe”, analisa.

Taibo pesquisa as possíveis causas e consequências de um próximo colapso das sociedades capitalistas. Entre as causas ressalta questões como mudanças climáticas e crise de matriz energética em nível global, mas não descarta o papel que epidemias e pandemias podem desempenhar em um processo de desagregação social e econômica. Avalia, ao contrário de outros especialistas, que a atual situação de pandemia tem mais a ver com as consequências, do que com as causas, das crises – no plural – que atualmente estão instaladas em nossas sociedades.

“Na origem, a pandemia é, certamente, uma consequência das regras que impõem, em toda ordem, um capitalismo enlouquecido e descontrolado. Constitui, se assim podemos dizer, um reflexo cabal da miséria desse capitalismo”.

A entrevista completa pode ser lida a seguir.

Correio da Cidadania: Como encara a emergência da pandemia de covid-19 em todo o mundo, especialmente na Espanha, um dos países mais afetados até o momento ao lado de Itália, China, Irã e Índia?

Carlos Taibo: Como um sinal inquietante de que falamos de um período crítico para a manifestação de um colapso geral. E aqueles que o identificam com a etapa 2020-2050 não estavam, desgraçadamente, equivocados. Isto não significa, necessariamente, é claro, que o sistema não possa experimentar alguma recuperação. Significa que teremos diante dos nossos olhos, em todas as áreas, sinais de que esse sistema não funciona e urge introduzir mudanças radicais.

Correio da Cidadania: Qual teu pensamento a respeito da dicotomia presente em boa parte dos países ocidentais, incluindo os da América Latina, que apresenta um embate entre as medidas de isolamento social recomendadas pelos trabalhadores da saúde, e a ideia de que ‘a economia não pode parar’?

Carlos Taibo: Salta à vista que o capitalismo pretenda não dar um passo atrás. A morte de muitos seres humanos, sobretudo idosos, é vista como um problema menor em comparação com a manutenção da lógica do trabalho assalariado, da mais-valia e da mercadoria. Por trás desponta, como sempre, a subordinação dos governos, dos Estados, aos interesses de poderosas corporações econômico-financeiras que operam nos bastidores. E se faz evidente que a crise tem uma manifesta condição de classe. Não afeta da mesma maneira as elites e a quem têm de acudir, dia após dia, ao trabalho – da mesma forma que exames e tratamentos não estão ao igual alcance de todos.

Correio da Cidadania: Como isso se relaciona com a necessidade de deixar nossas sociedades menos complexas, ideia que você coloca em seu livro Colapso?

Carlos Taibo: A discussão tem a ver com a relação entre complexidade e independência. Não notamos que quanto mais complexas são nossas sociedades, mais dependentes somos. E, como resultado, somos menos capazes de resolver, ‘de baixo e daqui’, por nós mesmos, de forma autogerida, os nossos problemas. Isto colocou nas mãos do capital, e de suas diferentes estruturas de poder, capacidades de controle e de submissão das que antes carecia.

Correio da Cidadania: Podemos dizer que a pandemia tem um caráter de consequência, e não de causa, das crises no capitalismo?

Carlos Taibo: Na origem, a pandemia é, certamente, uma consequência das regras impostas, em toda ordem, por um capitalismo enlouquecido e descontrolado. Constitui, se assim podemos dizer, um reflexo cabal da miséria desse capitalismo. É certo que, a partir daí, se abrem duas interpretações.

A primeira sublinha que a pandemia se transformará, infelizmente, em uma ferramenta decisiva para permitir que o capital retome, em condições ainda mais vantajosas que as de há pouco, sua condição de proeminência. A segunda entende, ao contrário, que desnudará as disfunções de um capitalismo aberrante, curtoprazista e sem projeto de futuro. Sinto-me mais cômodo com a segunda interpretação do que com a primeira.

Correio da Cidadania: É possível que essas crises se transformem em colapso geral do capitalismo? Em que medidas podemos começar a falar em colapso – uma vez que tanto meios de comunicação como autoridades fogem do assunto – e como podemos caracterizar este colapso?

Carlos Taibo: No meu livro ‘Colapso’, do qual há uma versão publicada no Brasil, em Curitiba, defino o colapso da seguinte maneira: ‘Um processo, ou um momento, do qual se derivam várias consequências delicadas: mudanças substanciais, e irreversíveis, em muitas relações, profundas alterações no que se refere à satisfação das necessidades básicas, reduções significativas no tamanho da população humana, uma perda geral de complexidade em todos os âmbitos – acompanhada de uma crescente fragmentação e de um retrocesso dos fluxos centralizadores -, o desaparecimento das instituições previamente existentes e, por fim, a quebra das ideologias legitimadoras e de muitos dos mecanismos de comunicação da ordem anterior.

As causas principais do colapso que estudo no livro são duas: as mudanças climáticas, por um lado, e o esgotamento de todas as matérias primas energéticas, por outro. Mas assinalo que há outros fatores que, aparentemente secundários, podem aparecer como multiplicadores das tensões. E entre eles menciono, de maneira expressa, epidemias e pandemias. Creio que, por falta de um conhecimento maior, é razoável afirmar que talvez nos encontraremos diante de um cenário próprio do que chamarei de ‘antessala do colapso’. Resta determinar, enfim, se podemos falar de um colapso do capitalismo ou, mais além, de um colapso da civilização humana como um todo.

Correio da Cidadania: O que é o Ecofascismo? De alguma maneira autoridades e lideranças nacionais e globais poderiam se aproveitar da situação para implantar uma agenda própria de poder, próxima ao conceito de Ecofascismo?

Carlos Taibo: Estaríamos equivocados se concluíssemos que as ideias que defenderam os nazistas alemães oitenta anos atrás remetem a um momento histórico conjuntural e irrepetível: muitas dessas ideias parecem chamadas a reaparecer hoje, não defendidas por ultramarginais grupos de neonazis, senão postuladas por alguns dos principais centros de poder político e econômico, cada vez mais conscientes da escassez geral que se avizinha e cada vez mais firmemente decididos a preservar em umas poucas mãos esses recursos escassos, ao amparo de um projeto de darwinismo social militarizado, isto é, de ecofascismo. Este último entende que no planeta sobra gente, de tal maneira que se trataria, na versão mais suave, de marginalizar aqueles que sobram – isto já fazem – e, na mais dura, de exterminá-los diretamente.

Ainda seria excessivo concluir que as medidas de recorte estatista, hierarquizantes, repressivas e militarizadas que aplicam hoje tantos governos obedecem em sentido estrito a um projeto ecofascista. Parece que a experiência conseguinte, com a ratificação da servidão voluntária que abraçam muitas pessoas, está chamada a aportar dados muito sugestivos diante dos desdobramentos desse projeto.

Correio da Cidadania: Os colapsos dos sistemas de saúde, como vemos na Itália, poderiam ter influência neste processo, mesmo que de maneira indireta?

Carlos Taibo: Poderiam, sim, em virtude uma razão precisa: colocam graficamente diante dos olhos das pessoas as misérias da gestão neoliberal, da gestão capitalista, de uns serviços sociais destinados a reproduzir sem meio termo a força de trabalho. Nunca se sublinhará o suficiente, contudo, de que não basta fortalecer os serviços sociais: é preciso apostar, para nos liberarmos de tutelas externas, por sua autogestão e socialização plenas.

Correio da Cidadania: O que esperar do mundo após o fim do período mais crítico da pandemia e quais devem ser os principais desafios que nos serão impostos?

Carlos Taibo: Temos de estar muito atentos aos perfis da pós-pandemia, se é que chegará. Há poucos dias, e em outra entrevista, identifiquei aqueles que creio serem os nossos deveres. Por um lado, colocar no núcleo do debate a discussão sobre o capital, o trabalho assalariado, a mercadoria, a mais-valia, a alienação, a exploração, o espólio dos países do sul global, a sociedade patriarcal, as guerras imperiais, as crises ecológicas e o colapso. E, pelo outro lado, perfilar os movimentos anticapitalistas que, longe da lógica dos Estados, coloquem a autogestão e o apoio mútuo no núcleo de sua ação. Somamos ao acerto desses movimentos muitos dos elementos das sociedades pré-capitalistas. Já sei que fácil não é, e não será.

Raphael Sanz é jornalista e editor-adjunto do Correio da Cidadania.


Publicado em Correio da Cidadania.

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