Cinco livros de ficção científica sobre anarquismo (por Margaret Killjoy)

Oh, anarquismo, que estranha criatura você é. Outrora, uma grande força política em todo o mundo (anarquistas superaram os comunistas por algum tempo na China pré-revolucionária, por exemplo), o anarquismo é agora uma das ideologias políticas mais incompreendidas.

Os anarquistas se movem por uma sociedade sem instituições (estado, capitalismo, patriarcado etc.) que criam disparidades de poder entre vários tipos de pessoas. Os anarquistas não são contra a organização, mas sim contra a autoridade. Esta tem sido sua identidade política desde que o revolucionário francês Pierre Joseph Proudhon se identificou como anarquista em meados do século 19.

Os anarquistas têm sido fundamentais em vários movimentos e revoluções sociais. Talvez o mais famoso seja que a jornada de trabalho de oito horas que foi vitoriosa na esteira da morte de cinco anarquistas em Chicago, que foram assassinados pelo Estado simplesmente por serem anarquistas.

O anarquismo provavelmente atingiu seu ponto mais alto na década de 1930 durante a Guerra Civil Espanhola, quando grande parte da Espanha chegou a ser administrada coletivamente, sem autoridade do Estado. Isso continua desde então, e os anarquistas continuam envolvidos no ativismo e na luta revolucionária em todos os lugares.

Não gosto muito de ler teoria política. Adquiro quase todas as minhas idéias através de conversação e pela ficção. O mundo precisa de novas idéias, agora mais do que nunca. A ficção especulativa é especialmente adequada para a exploração de novas idéias. Felizmente, existem muitos romances incríveis que exploram a sociedade, a filosofia ou a luta anarquistas.

Seguem cinco desses livros de ficção.

Os Despossuídos de Ursula K. Le Guin

Seria preciso um anarquista – ou, suponho, alguém intensamente crítico das estruturas de poder e das soluções dogmáticas – para virar o gênero utópico de cabeça para baixo. Com Os Despossuídos, Le Guin fez exatamente isso. Anarres, uma de lua anarquistas, orbita o planeta autoritário de Urras. Anarres é administrado coletivamente, sem governo ou capitalismo. Mas nosso protagonista lunar, farto dos sufocantes sistemas de controle social que interferem em sua pesquisa científica, dirige-se a Urras para aprender como é um mundo com governo. Eu amo este livro por várias razões, mas sou particularmente atraída por quão bem ela contrasta as imperfeições da lua anti-autoritária e do planeta autoritário. Para ser sincera, não quero morar em Anarres (prefiro não ser nomeada por um computador!), mas não sei se há uma exposição mais magistral do anarquismo do que a que ela escreveu.


A Quintessência Sagrada de Starhawk

Starhawk é mais conhecida por sua não-ficção do que por sua ficção. Ela escreve sobre ativismo, magia e compreensão de sistemas de poder. Eu admito, não li muito sobre sua não-ficção. Mas quando eu era uma jovem ativista que lutava contra a invasão americana do Iraque, li seu romance utópico A Quintessência Sagrada e vi uma visão de uma sociedade na qual eu queria – quase desesperadamente – viver. Na cidade pós-apocalíptica de São Francisco, um grupo de mulheres se reúne e destrói as ruas para plantar alimentos. A cidade se torna uma espécie de comuna, com uma assembléia aberta que toma suas decisões, deixando os indivíduos livres para contribuir com a sociedade como preferirem. A maior parte da história se concentra no papel da violência e do pacifismo na defesa de uma sociedade igualitária, mas para mim a parte mais forte deste livro é a beleza impressionante da possibilidade humana que sugere.


Walkaway de Cory Doctorow

Acabei de terminar este livro há uma ou duas semanas e está no primeiro plano de meu cérebro. Não sei se existe um livro que eu tenha lido que seja mais diretamente relevante para os problemas que o mundo enfrenta atualmente. Em Walkaway, uma cultura de inconformismo internacional de squatters, hackers, cientistas, artistas e outros similares está vivendo “os primeiros dias de uma nação melhor”. Acho que nunca houve uma ficção mais convincente para explorar os meandros de como as pessoas podem ser motivadas a contribuir para a sociedade sem dinheiro ou trabalho obrigatório. O Walkaway se passa na segunda metade do século XXI, quando tecnologias como a impressão 3D removeram o fantasma da escassez da economia, mas suas lições também são diretamente relevantes agora. Doctorow traz valores anti-autoritários não apenas para o conteúdo, mas para a forma do livro: ele segue personagens de perto no centro de algumas das ações, mas não finge que o grupo de pessoas será o ponto focal de todos os aspectos de uma revolução.


The Watch de Dennis Danvers

É possível que The Watch seja a minha história favorita de viagem no tempo que eu já li, porque é sobre um dos meus personagens históricos favoritos – o príncipe russo que se tornou revolucionário e cientista Peter Kropotkin – transportado para uma época e um lugar onde estou mais familiarizada: a cena ativista de Richmond, Virgínia, 1999. Também é possível que seja minha história favorita de viagem no tempo, porque é maravilhosamente discreta e Danvers é um mestre em deixar seus personagens do passado cairem no presente agindo de forma realista. De qualquer forma, é minha história de viagem no tempo favorita.


The Steel Tsar de Michael Moorcock

Nem toda ficção anarquista é tão séria. Algumas delas são simplesmente divertidas. Ninguém cria uma aventura clássica de viés anti-autoritário como Michael Moorcock. O Steel Tsar é o último da trilogia Nomad In the Time Stream, que, para o registro, é o primeiro trabalho steampunk completo que eu já encontrei. Eu poderia divagar sobre Moorcock e todas as influências não reconhecidas que ele teve neste mundo (os RPGs de mesa devem a Moorcock pelo menos tanto crédito quanto eles devem a Tolkien, além do mais, ele inventou a estrela do caos, e mais… steampunk …), mas, em vez disso, eu vou apenas lhe dizer que o Steel Tsar tem aeronaves, armas nucleares, um Stalin robótico e o anarquista ucraniano Nestor Makhno. Ou seja, nas mãos de um mestre experiente como Moorcock, você realmente não pode seguir errado.


Sobre a autora

Margaret Killjoy é uma autora transfeminista, nascida e criada em Maryland, que passou sua vida adulta viajando sem lar fixo. Formada em 2015 pela Clarion West, as ficções curtas de Margaret foram publicadas por Tor.com: Strange Horizons, Vice’s Terraform e Fireside Fiction, entre outros. Ela fundou a Steampunk Magazine em 2006 e seus livros de não-ficção foram publicados pela editora anarquista AK Press. Margaret escreveu A Country of Ghosts, um romance utópico publicado pela Combustion Books em 2014. Ela também é autora da série Danielle Cain, começando com The Lamb Will Slaughter the Lion, publicado em Tor.com

Traduzido de Reactormag.

Mapeamento da Literatura Gaúcha: Desafios, Potências e Impactos Climáticos

A pesquisa Mapeando a Cena Literária do Rio Grande do Sul, realizada pela Associação Cultural Nonada Jornalismo, oferece um panorama abrangente do setor literário gaúcho, destacando desafios e potencialidades enfrentados por escritores, editoras, livrarias e feiras literárias.

Principais Resultados

Escritores

  • 93% dos autores não vivem exclusivamente da escrita.
  • 80% afirmam que a escrita representa menos de 25% de sua renda mensal.
  • 79,4% já participaram de programações literárias.

Editoras

  • 50,8% têm mais de 10 anos de atuação.
  • 32,3% faturam menos de R$ 5 mil mensais; apenas 18,5% superam R$ 50 mil.
  • 60% apontam a distribuição como principal desafio.
  • 64,6% foram impactadas pelas enchentes de maio de 2024.

As editoras desempenham um papel central na cadeia literária, não apenas viabilizando publicações, mas também articulando a circulação de obras e a profissionalização de autores. No entanto, enfrentam grandes entraves estruturais: além da baixa margem de lucro e dificuldade de distribuição, muitas operam de forma independente, com equipes reduzidas e sem acesso a políticas públicas consistentes. O impacto das enchentes de 2024 evidenciou ainda mais sua fragilidade, com perdas de acervo, suspensão de atividades e incertezas sobre a continuidade de seus trabalhos.

Livrarias

  • 64,8% estão ativas há mais de 10 anos.
  • 28% faturam acima de R$ 50 mil mensais.
  • 66,7% realizam vendas online.
  • 40,7% consideram a concorrência o maior obstáculo.

Feiras Literárias

  • 63,1% já realizaram mais de 15 edições.
  • 56,5% são organizadas por prefeituras.
  • 69,6% enfrentam falta de patrocinadores como principal dificuldade.
  • Quase metade foi afetada pelas enchentes de 2024.

Impactos Climáticos

A pesquisa revela um dado alarmante: eventos climáticos extremos, como as enchentes de maio de 2024, afetaram significativamente a cadeia literária no estado. Editoras, livrarias e feiras relataram perdas materiais, cancelamentos de eventos e dificuldades de recuperação financeira, ressaltando a vulnerabilidade do setor diante da crise climática e a urgência de políticas públicas voltadas à resiliência cultural.

Metodologia e Produtos

O estudo entrevistou mais de 450 profissionais do setor e resultou em:

  • Um relatório digital de 168 páginas.
  • Uma revista impressa com tiragem de 2.000 exemplares, distribuída gratuitamente em feiras, livrarias e espaços culturais.
  • Um podcast acessível com quatro episódios, abordando os eixos da pesquisa e entrevistas com representantes do setor literário.

O projeto foi financiado pelo Ministério da Cultura e pela Secretaria de Estado da Cultura do RS, via Lei Paulo Gustavo, com apoio de diversas entidades do setor.

Para mais informações e acesso aos materiais, visite o site oficial da pesquisa: nonada.com.br
Podcast no Spotify: ouvir aqui

Anarquia na era dos dinossauros – Apoie o lançamento do livro

Anarquia na era dos dinossauros, publicado pela Curious George Brigade e que agora ganha versão em português brasileiro pela Monstro dos Mares, é um mergulho nas crônicas da anarquia que já vive e ressoa por todo o mundo.

Alguns dos incontáveis disfarces usados pela Autoridade são o Capitalismo, o Estado e a Hierarquia. Mas o que virá depois dos dinossauros? A resposta: a anarquia.

Das favelas da América do Sul à Resistência Francesa na Segunda Guerra Mundial, passando pelos motins no exército estadunidense na Guerra do Vietnã, Anarquia na era dos dinossauros é sobre e para os anarquistas de hoje. Defendendo a descentralização, o caos, o apoio mútuo e as asas das borboletas, entre muitas outras coisas, os textos neste livro dão vida a táticas e estratégias para uma resistência eficaz contra os dinossauros atuais.

Anarquia na era dos dinossauros
The Curious George Brigade

Anarquia na era dos dinossauros
The Curious George Brigade
Monstro dos Mares
166 páginas
Papel pólen natural de 80g, orelhas de 7 cm.

Capa colorida com ilustração de Jane Herkenhoff (@jane.herkenhoff)
Tradução de DaVinci, anônimo e Monstro dos Mares
Revisão e preparação: Caronte Mayer
Diagramação: Baderna Jaime

Dinossauros

Nós, da Curious George Brigade, escrevemos este livro, propositalmente, não como mais um manifesto, ou como um livro chato da história anarquista morta. Na verdade, escrevemos este livro para ser um sopro de ar fresco, um testemunho da anarquia viva. Declaramos na primeira página que devemos esquecer a Guerra Civil Espanhola e continuar nosso ataque à tradição, anarquista ou não, a partir daí.

A anarquia, pelo menos nas páginas dos livros, está sofrendo com muitos historiadores pesados e teóricos hipócritas. Para quebrar esse molde, este livro se concentra em exemplos vivos de anarquia. Escrevemos este livro porque o que está acontecendo hoje é mais importante do que o que aconteceu há várias décadas ou algum esquema utópico distante para o futuro. Ao contrário de alguns anarquistas, não perdemos a esperança… todos ao nosso redor são anarquistas cheios de esperança de mudança. A beleza disso é que os anarquistas estão fazendo isso sozinhos, mudando o mundo.

O mínimo que podíamos fazer era documentar isso e tentar dar voz a essas pessoas comuns que estão fazendo coisas extraordinárias. Também não poupamos esforços contra os inimigos da anarquia: tudo, desde reuniões longas e chatas até o simbolismo disfarçado de divulgação. Lutando pela honestidade, reconhecemos muitos dos maus hábitos de obediência, adoração contínua ao líder, eficiência e delírios de controle. Todos esses são hábitos dos dinossauros, sobras do Capitalismo e do Estado.

No entanto, anarquistas estão conquistando vitórias concretas todos os dias, formando comunidades de resistência, transformando suas vidas cotidianas em veículos para a revolução, criando novos mitos que ressoam com honestidade e coragem. E eles mesmos fazem isso, contra a corrente de uma sociedade baseada em especialistas pagos.

Nós bancamos o que falamos. Este é um projeto faça-você-mesmo. Muito tempo e esforço foram dedicados a encontrar a palavra certa, criar a imagem certa e ajustar essas margens. Esperamos que goste!

The Curious George Brigade

Celebrando 20 anos de Resistência e Inspiração: Utopia e Luta!

Neste início de 2025, a Editora Monstro dos Mares saúda e celebra os 20 anos de uma das experiências mais significativas de autogestão, luta por moradia e construção coletiva em Porto Alegre: o assentamento urbano Utopia e Luta. Mais do que uma ocupação, esse espaço se consolidou como símbolo de resistência e uma alternativa concreta às desigualdades impostas pelo sistema.

O que é o Utopia e Luta?

Para quem ainda não conhece, o Utopia e Luta nasceu em 2005, quando um grupo de famílias organizadas por movimentos sociais ocupou um prédio abandonado na Avenida Borges de Medeiros, no coração da cidade. Ali começou uma luta pela garantia do direito à moradia digna, ao mesmo tempo em que surgia uma experiência inovadora de convivência e autogestão.

Hoje, 20 anos depois, o Utopia e Luta é muito mais que um lar para dezenas de famílias. É um centro pulsante de iniciativas culturais, ambientais e políticas. Seu legado inspira quem acredita em formas horizontais e solidárias de organização, mostrando que a transformação social não só é possível, como está acontecendo.

Por que celebrar?

O Utopia e Luta é motivo de celebração por muitas razões:

  • Autogestão e Coletividade: Todas as decisões no assentamento são tomadas de forma coletiva, em assembleias onde cada voz importa.
  • Sustentabilidade: Com soluções como captação de água da chuva e horta hidropônica, o espaço se tornou um exemplo de convivência sustentável em um contexto urbano.
  • Cultura e Resistência: O assentamento promove atividades culturais, oficinas e eventos abertos à comunidade, mantendo viva a chama da luta e do diálogo.
  • Regularização e Conquista: Após anos de luta, o prédio foi regularizado, se tornando um modelo de habitação popular em área central.

Um convite à reflexão

No momento em que celebramos duas décadas dessa experiência transformadora, também convidamos você a refletir sobre a cidade que queremos. Como podemos ocupar e dar vida a espaços abandonados? Como fortalecer as redes de solidariedade e resistência em nossos territórios?

O Utopia e Luta nos lembra que os desafios urbanos podem ser enfrentados com coragem, criatividade e união.

Nosso agradecimento

A Editora Monstro dos Mares presta sua homenagem ao Utopia e Luta, agradecendo por mostrar que os sonhos coletivos podem se materializar. Que a inspiração dessa história continue ecoando e construindo pontes para muitos anos de luta e utopia!

Conheça e participe

Se você ainda não conhece, vale a pena se aproximar e vivenciar essa experiência de transformação social. O Utopia e Luta está localizado na Avenida Borges de Medeiros, 711, no centro de Porto Alegre, Rio Grande do Sul. Seja visitando, divulgando ou apoiando iniciativas similares na sua cidade, todos podemos fazer parte dessa grande rede de resistência e construção coletiva.

Utopia e Luta: 20 anos de resistência, aprendizado e construção de futuros possíveis. Parabéns!

Um encerramento memorável: nosso encontro virtual de fim de ano

Na última sexta-feira, 13 de dezembro, a Editora Monstro dos Mares realizou seu tão aguardado encontro virtual de fim de ano, reunindo apoiadoras e apoiadores, autoras e autores, revisores, tradutores, diagramadores, capistas e outras pessoas que ajudam a dar vida aos nossos projetos. O evento aconteceu pelo Google Meet e foi marcado por momentos de troca, celebração e planejamento coletivo.

Com um ambiente descontraído e acolhedor, o encontro começou com uma breve retrospectiva do ano de 2024. Compartilhamos os desafios que enfrentamos, os aprendizados conquistados e, claro, as grandes realizações que só foram possíveis graças ao trabalho em equipe e ao apoio da nossa comunidade. Foi emocionante ouvir relatos de diversas perspectivas, destacando o impacto de nossas publicações e os passos dados rumo a uma editora mais inclusiva e acessível.

Um dos momentos mais especiais foi quando cada participante teve a oportunidade de compartilhar seus desejos para 2025. Ideias inovadoras, novos projetos e colaborações foram imaginados em um bate-papo leve e inspirador. O sentimento de pertencimento e coletividade esteve presente em cada palavra, reafirmando o compromisso de todos com a construção de um espaço editorial que valoriza a diversidade e a criatividade.

Encerramos a noite com sorrisos, agradecimentos e a certeza de que 2025 será mais um capítulo incrível para a Editora Monstro dos Mares. Nosso encontro foi mais do que uma celebração: foi uma renovação de entusiasmo e propósitos para continuar navegando rumo a novos horizontes.

Agradecemos a todos e todas que participaram e ajudaram a tornar este momento tão especial. Que possamos seguir juntos, somando forças e ideias para um futuro cheio de possibilidades!

Até o próximo encontro!


Nossas publicações de 2024:

Encontros entre os Cinemas e as Histórias: Ontem Cinema, Hoje História?

Relato enviado por Juliano Gonçalves da Silva, autor de “O índio no cinema brasileiro e o espelho recente“.

Entre os dias 4 e 6, a Cinemateca Brasileira, em São Paulo, reconhecida por sua excelência, acolheu mais de uma centena de pesquisadores de todo o Brasil, além de representantes da Argentina, Uruguai e Chile. O evento foi um espaço privilegiado para a apresentação de resultados de pesquisas que abordaram a relação entre cinema e história.

Os filmes apresentados retrataram perpetradores e genocidas, do passado e do presente, expondo tensões, violências e as complexidades da memória histórica. As discussões exigiram dos participantes coragem e “neutralidade científica” para enfrentar temas tão delicados, ao mesmo tempo em que destacaram a relevância dessas análises para entender as ditaduras que ainda deixam marcas e ameaçam o presente no Brasil e no mundo.

Diversidade Cinematográfica e Epistemológica

As reflexões trouxeram caminhos de liberdade e resistência a partir de releituras de figuras pioneiras do cinema brasileiro, como Lélia Gonzalez, que inseriu questões raciais na tela e na historiografia. Também foram abordados diferentes movimentos cinematográficos, novos e antigos, como o cinema marginal, udigrudi, militante, contracultural, negro, queer e o florescente cinema ameríndio em um Brasil ainda marcado pela colonialidade.

O evento enfatizou as novas metodologias para a constituição de fontes imagéticas e arquivos fílmicos, reconfigurando possibilidades de pesquisa e aproximando o cinema de diversas abordagens epistemológicas e artísticas. Envolvimentos, percepções e afetos emergiram nas análises de produções de todo o mundo, que exploraram desde diretores consagrados, como Spielberg, até narrativas menos conhecidas, como o cinema latino-americano inspirado nos xamãs.

Mesas e Lançamentos

Os debates iluminaram temas como as ditaduras e o “teatro da política”, as identidades na tela (com destaque para o cinema negro), os perpetradores e os espaços de violência no audiovisual, além de questões sobre preservação e arquivos audiovisuais.

Durante o evento, também ocorreu o lançamento de diversas obras importantes, que contribuíram para a divulgação de novos estudos e reflexões. Entre os destaques:

  1. CONCEIÇÃO, Alexandra Castro. A Caméra-stylo de Vicente F. Cecim. São Paulo: UICLAP, 2024.
  2. DEL VALLE-DÁVILA, Ignacio; BOSSAY, Claudia. Miradas descentralizadas: Las notícias de UCV-TV (1968-1977). Santiago de Chile: Cineteca Nacional de Chile, Fundación Centro Cultural Palacio de la Moneda, 2024.
  3. FERREIRA, Ceiça; REIS, Lidiana (org.). Águas correntes: mulheres no audiovisual do Centro-Oeste. Goiânia: Editora UEG, 2024.
  4. FREIRE, Marcius; SCANSANI, Andréa C. Por um cinema de cordel: um livro de Sergio Muniz. São Paulo: Editora Alameda, 2024.
  5. GARCIA, Alexandre Rafael; OPOLSKI, Débora (orgs.). Cinema, criação e reflexão: 10 anos de Cinecriare. Araraquara: Letraria, 2024.
  6. GRUNER, Clóvis; KAMINSKI, Rosane (org.). História e Imagem: representações de traumas. Jundiaí, SP: Paco Editorial, 2024.
  7. GUSMÃO, Milene Silveira et al.. Memórias e Histórias do Cinema na Bahia. v. 1. Salvador: EDUFBA, 2024.
  8. QUEIROZ, André (comp. e tradução). Fernando Pino Solanas: cinema, política e libertação nacional. Florianópolis: Editora Insular, 2022; Cinema e luta de classes na América Latina. Florianópolis: Editora Insular, 2024.
  9. SILVA, Juliano Gonçalves. O índio no cinema brasileiro e o espelho recente. Ponta Grossa: Editora Monstro dos Mares, 2020.
  10. SILVA, Mile; FRANÇA, Lecco; COELHO, Jamile. Cinema negro baiano. Salvador: Emoriô, 2021.
  11. SORANZ, Gustavo. Cinema no Amazonas: 1960-1990. Manaus: Rizoma Audiovisual, 2022.
  12. TEDESCO, Marina C. Mulheres que constroem imagens: a parceria criativa de Kátia Coelho e Lina Chamie. Niterói, RJ: PPGCine-UFF Publicações, 2024.
  13. WSCHEBOR PELLEGRINO, Isabel. De la ilustración científica a la documentación cinematográfica: aproximaciones a la historia de la fotografía y el cine científicos en Uruguay (1890-1973). Montevideo: Udelar, 2024.
  14. ZYLBERMAN, Lior. Genocidio y cine documental. Sáenz Peña: Eduntref, 2022.

Reflexões Finais

O evento também destacou a importância dos encontros presenciais, onde “cafezinhos” e conversas informais enriquecem as trocas acadêmicas. Esses momentos de interação entre pares revelaram-se fundamentais para compartilhar dúvidas, angústias e novos caminhos para pesquisas que, muitas vezes, começam de maneira solitária em arquivos e cinematecas.

Ao final, comprovou-se que o trabalho coletivo é mais poderoso do que qualquer esforço individual. Você também está convidado para o próximo encontro, que será realizado em João Pessoa, carinhosamente apelidada de Jampa, na Paraíba!


Fortaleça o financiamento coletivo de “10 perguntas sobre o anarquismo”

10 perguntas sobre o anarquismo

Neste fim de ano, a Editora Monstro dos Mares tem a alegria de trazer ao público brasileiro a tradução para o português do livro 10 perguntas sobre o anarquismo , escrito pelo jornalista e pesquisador independente francês Guillaume Davranche.

Lançado na França em 2020, o livro já vendeu mais de dez mil cópias em seu país de origem. Escrito para diversos públicos, Davranche apresenta perspectiva detalhada das diferentes abordagens do anarquismo sobre temas fundamentais como economia, ecologia, feminismos, democracia, organização e ação.

Além disso, fornece um panorama sobre perfis de militantes ao redor do mundo – da Coreia ao México, da Argélia à Espanha. Ao resgatar a história de figuras que ajudaram a moldar o movimento anarquista ao longo do tempo, ampliam-se as compreensões das estratégias e impactos do anarquismo em diversos contextos revolucionários.

O texto da edição que apresentamos vem diretamente do original em francês intitulado Dix questions sur l’anarchisme, cujos direitos foram gentil e generosamente cedidos ao Centro de Cultura Libertária da Amazônia e à Monstro dos Mares. Desejamos que este livro se torne mais uma ferramenta de expansão do conhecimento político não apenas entre iniciantes com o intuito da autoinstrução, mas também entre quem se dedica à prática de educações abertas às dissidências.

10 perguntas sobre o anarquismo
Guillaume Davranche
CCLA + Monstro dos Mares
120 páginas
Miolo: papel off white, 80 g
Capa: papel cartão 300 g, colorido
Lombada quadrada, fresado, PUR
Impresso em gráfica
ISBN: 978-65-86008-40-1

Fortalecer o lançamento do livro

10 perguntas sobre o anarquismo apresenta as diferentes abordagens do anarquismo sobre temas fundamentais e os perfis de vinte militantes ao redor do mundo que ajudaram a moldar o movimento anarquista ao longo do tempo.

Monstro dos Mares: Navegando novos rumos na publicação anarquista

A Monstro dos Mares, uma editora de publicações anarquistas, agora está em Cachoeira do Sul/RS, cidade onde foi fundada em junho de 2013. Após oito anos no Paraná, onde aprendemos muito sobre processos editoriais, produção artesanal, distribuição e, principalmente, a criação de comunidades por meio do livro impresso e suas possibilidades, retornamos ao interior e iniciamos a implementação de mudanças significativas em nosso modo de produzir.

Com o passar dos anos, novas necessidades e configurações demandaram novas soluções. Hoje, precisamos encontrar maneiras de continuar existindo como coletivo editorial em um momento de distâncias – e isso afeta diretamente as nossas possibilidades de produção artesanal.

Por isso, todas as publicações passaram a ser produzidas em gráfica e conforme a demanda de pedidos em nossa loja. Além disso, alguns livros estão disponíveis em diferentes marketplaces.

Para realizar essa transição, foi necessária uma reformulação de nosso catálogo, que passa agora a ser constituído apenas de livros. Os zines que integravam o catálogo da Monstro dos Mares passarão a ser produzidos pelas amizades da Impressora Anarquista, de Goiânia/GO.

A Monstro dos Mares continua produzindo com a mesma radicalidade desses 11 anos, e celebramos as cinco impressoras, a impressão de um milhão de folhas e a produção de milhares de livros e zines artesanais.

Neste novo capítulo, nos dedicaremos a encontrar novos títulos, elaborar mais textos e lançar publicações que possam contribuir com a educação e as ideias de quem está fazendo o século 21, seja na escola, nos movimentos sociais, nas universidades, no trabalho, no campo ou na cidade.

Içamos nossas velas, mais uma vez navegando sonhos e desejos em direção à Utopia, na companhia das amizades com quem compartilhamos as águas turbulentas das publicações independentes de livros anarquistas no nosso tempo.

2024 conviver é formar comunidades

Acreditamos que a atividade de fazer livros está ligada à reflexão sobre o tempo em que vivemos. Por isso, a cada início de ano escolhemos um tema para nos acompanhar no dia a dia. Este texto expõe nossas reflexões e visões mundo para inspirar as atividades de 2024.

Cada atividade que realizamos na Monstro dos Mares é movida por identificar e reconhecer em nossas práticas os princípios que buscamos assimilar e disseminar por meio das publicações que distribuímos. As bases estruturais existir, permanecer, conviver, educar e celebrar transbordam nossa atividade de fazer livros de inspiração anárquica. Queremos que, cada vez mais, a editora se torne um espaço no qual as pessoas se articulam e transformam encontros em trocas, convivência harmoniosa, música e boas conversas. Os livros e as pessoas, em conjunto, transformam qualquer lugar em um recanto para a construção da convivência e o que de bom pode vir dela: compartilhar e colaborar. Acreditamos que compartilhar e colaborar são boas formas de se pensar a construção de comunidades.

Comunidades são mais que grupos de pessoas que compartilham ideais, necessidades, acasos ou algum outro laço que as mantém juntas – temporária ou permanentemente. A formação de comunidades depende da convivência, e a convivência depende de espaços para que as pessoas se encontrem, produzam, aprendam, celebrem e façam o que mais quiserem fazer. Esse tipo de aliança depende também de mudanças de hábitos, como se abrir para participar de atividades que, talvez, você não se engajaria se não fosse pela conexão com as pessoas envolvidas ou com o espaço onde as atividades serão realizadas.

Nossas experiências têm nos mostrado que temos duas lutas político-privadas que necessitam da nossa atenção. A primeira é que precisamos, política e privadamente, lutar para que se torne possível a multiplicação de espaços autônomos fomentadores de diálogo. Falamos, por exemplo, de aluguéis e zoneamento urbano, que dificultam a manutenção de espaços sem fins comerciais diretos. A segunda é que precisamos, política e privadamente, lutar para transformar a cultura de isolamento que nos cerceia as alianças comunitárias. Aqui, estamos falando de, por exemplo, trabalharmos demais e não conseguirmos encontrar nossas amizades, ou então das economias de intimidade da heteronormatividade, que culturalmente nos dificultam a aproximação e troca com pessoas que acabamos de conhecer.

Conviver é, por definição, não estar só; ou seja, é viver juntes.

Já há alguns anos almejamos transformar, gradativamente, a editora em um espaço de convivência e produção em que as pessoas possam chegar para aprender, conversar, tomar um café, tocar os próprios projetos e compartilhar ideias. Ou talvez não fazer nada por um tempo. Um dos desafios que reconhecemos é incentivar, efetivamente, o hábito de ocupar espaços em que as pessoas podem ter acesso a algo gratuitamente: quero dizer, como uma biblioteca. Em uma biblioteca, não é necessária nenhuma troca financeira mediando o acesso aos livros. O acesso a trocas no espaço da editora é imaginado por nós um pouco como o acesso a uma biblioteca onde é possível encontrar livros, pessoas para conversar, um cafezinho e uma cachorra amorosa. Certamente a analogia pode ser problematizada e a comparação entre o espaço da editora e uma biblioteca vir a se tornar não muito boa, mas é importante reforçar a ideia da convivência ao redor dos livros, das conversas e da convivência.

Assim como a disseminação de ideias libertárias foi alavancada por meio da imprensa, que tornou possível a distribuição facilitada e em maior quantidade de panfletos, periódicos, cartazes e outros materiais impressos entre as pessoas e suas comunidades, os espaços que permitiam que as pessoas se encontrassem para conversar também foram fundamentais para que a convivência impulsionasse o pensamento crítico e autônomo, a auto-organização para a solução de problemas comuns, e o apoio-mútuo. Ou seja, a criação de comunidades politicamente engajadas e organizada por meio das trocas entre as pessoas.

Quanto mais encontros, risadas e boas conversas nós pudermos ter, mais poderemos colaborar. Mais nossas conexões se fortalecerão e mais sentiremos apoio em nossas comunidades, e apoiar iniciativas de nossas amizades tem transformado a convivência em produção coletiva e colaboração em projetos diversos, em que não nos veríamos envolvides não fosse a convivência no espaço da editora. Estamos conseguindo dar passos importantes rumo à construção de comunidades com mais inclusão, respeito às diversidades e fortalecedoras das economias alternativas, como a produção de artistes, artesães, poetes, mecaniques de bicicleta, cozinheires de rango vegan. Também estamos aprendendo muito sobre como garantir a participação das pessoas que trabalham na economia formal, de quem busca trabalho e também daquelus que desistiram de trabalhar.

Apoiar as pessoas que fazem parte das nossas comunidades é praticar o princípio do apoio-mútuo, assim como reconhecer o vigor das ideias e fortalecer a felicidade e a autonomia de todes como seus também. Nosso bando compartilha ideias vinculadas às causas que movimentam as pessoas com quem convivemos. Sonhamos que, com o passar do tempo, a Monstro dos Mares seja um lugar de articulação de comunidades de pessoas dispostas a experimentar outros modos de organizar nossos bondes, bandos e grupos.

Nossos livros são publicações experimentais criadas por pessoas criativas e consideradas amadoras; nossa oficina está em constante reformulação e melhoria; os textos são escritos por pessoas que, muitas vezes, nunca haviam sido publicadas antes; os papéis utilizados são convencionais e podem ser encontrados em qualquer papelaria. Nossos livros são publicações feitas por pessoas para quem os livros são, por um motivo ou outro, importantes. Elas estão interessadas em conteúdos originais, de natureza crítica, e que buscam modos de ultrapassar limites impostos pela forma, pela linguagem ou pela imagem – conscientes de que tais limites são, inegavelmente, tensões políticas contra as quais estamos lutando enquanto convivemos. Cada um de nossos livros e zines é o resultado do convívio, das convergências e das divergências de nossas comunidades. Os livros são, de toda forma, parte produto e parte produtora de nossa convivência.

As palavras, nas centenas de cópias de cada um dos livros e zines produzidos na Monstro dos Mares, espalham sementes de ideias pela defesa das florestas e seus povos, pelos ancestrais e originários, por nós e por quem virá, por um mundo repleto de bicicletas, mato, pirataria e hacking de todos os cistemas.

Conviver é formar comunidades.
Bom 2024.
Boas leituras, junte-se a nós!

Editora Monstro dos Mares

Encerramento PicPay Assinaturas

Olá amizades! Recebemos a informação do encerramento do serviço PicPay assinaturas onde mantivemos apoios durante um tempo. Um ótimo serviço, principalmente pela cobrança de taxas muito honestas. No entanto, a divulgação precária do sistema de assinaturas em conjunto com mudanças na gestão do PicPay levaram a essa descontinuação.

Agradecemos todas as pessoas que apoiaram nossa editora utilizando esse serviço e convidamos para continuar os apoios utilizando o Catarse e Apoia-se no Brasil e Ko-fi para apoios internacionais.

Um abraço.

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