Conseguimos! Foram mais de 70 dias de ansiedade. O lançamento do livro “Zumbi dos Palmares: por uma educação antirracista” foi nossa sexta campanha de financiamento coletivo. Desde de 2015, utilizamos essa modalidade para incrementar os recursos necessários para a publicação de alguns títulos. Sabemos que esse período exige uma certa insistência nas redes sociais. Elas são canais poderosos para sensibilizar nossas amizades sobre a importância do tema e informar como pretendemos distribuir o livro. Esta será nossa primeira experiência em que a distribuição será destinada a algumas bibliotecas comunitárias, coletivos e movimentos selecionados desde o primeiro dia da divulgação. Seria lindo se tivéssemos mais e mais endereços. Porém, optamos por enviar uma quantidade generosa de livros para cada e fazer com que cada coletividade decida o que fazer com o pacote de 20 livros que serão enviados aos 11 endereços. Será possível fazer grupos de estudos, fortalecer a leitura de educadores, distribuir em outros espaços, tirar cópias, vender. Cada grupo vai decidir o que e como. A hora é de fazer o material circular.
Com isso, queremos agradecer profunda e sinceramente todas as pessoas que puderam dedicar uma parte de seus recursos, seu carinho e boa vontade com a produção de Waltinho Vadala e de quem mais atuou nesse projeto. Muito Obrigado!
Tem tanta coisa acontecendo que as vezes fica difícil organizar as ideias. Nos 60 dias recentes tivemos greve de trabalhadores e trabalhadoras dos Correios, mudança de casa, algumas preocupações com a saúde e claro, a pandemia do coronavírus que ainda segue, mesmo que muitas pessoas estejam simplesmente ignorando esse fato.
Todos os meses, as pessoas que apoiam a Monstro dos Mares em sua atividade editorial recebem em suas casas um pacote com fanzines e materiais produzidos e distribuídos por nós ou impressos por amizades que muito gentilmente enviam seus livros e zines para navegar em nossos mares. Nosso calendário de envios, entretanto, acabou dando uma bagunçada e os materiais de Agosto foram enviados em Setembro, após o anúncio de encerramento da greve de profissionais atendentes, carteiros e OTT’s. Com isso, decidimos reunir os meses de Setembro e Outubro em um único pacote e enviá-los juntos, de modo a regularizar nossas entregas.
Vamos retribuir o carinho e a paciência das pessoas que continuam conosco, confiando e acreditando na atividade transformadora que é produzir livros artesanais. Apropriar-se de métodos e tecnologias, distribuir conhecimentos, fortalecer movimentos. Somente existimos como coletivo editorial porque as pessoas reconhecem em nossas práticas o conjunto de ideias que compartilhamos. Agradecemos imensamente!
A cada dia, uma nova mudança. Mudar, é isso que fazemos ao curso do tempo. Mudamos de estilo, atitude, ideia, éticas e práticas. Mudamos o tempo todo o modo de movimentar o mundo — mundos em justa consonância com as lutas contra o capitalismo, a colonialidade e o patriarcado em todas as suas expressões. Mundos possíveis, participativos, sociais, inclusivos, diversos. Novos mundos!
As pessoas que compõem a Monstro dos Mares decidiram que para continuar fazendo livros e zines era necessário mudar, muito mais do que levantar velas, mas jogar um pouco mais de pressão no vapor. Com isso, durante algumas semanas estivemos em processo de mudança para um espaço onde cabem mais ideias, mais livros e mais participação.
♪ O Vapor de Cachoeira não navega mais no mar, Barco véio tá cansado, sobe o rio devagar. Ai, ai, ai, sobe o rio devagar.
Chegamos nos Campos Gerais em Janeiro de 2019 e seguimos na cidade de Ponta Grossa por mais algum tempo. Aos poucos, vamos estabelecemos relações com o lugar, com as pessoas e vales que recortam o horizonte paranaense. Nosso endereço de correspondência continua exatamente o mesmo (Caixa Postal 1560, CEP 84071-981).
Na Sexta-feira, 16 de Outubro, o caminhão levou impressoras, mesas, caixas e caixas de material impresso, muita tralha para outro destino. Novos ares! Mais do que coisas, carregamos nossa vontade de continuar fazendo livros e zines de ideias anárquicas e anarquistas, epistemologias dissidentes e pensamento radical sobre nosso tempo e queremos agradecer todas as pessoas que apoiam a existência desse projeto editorial.
Às vezes, ir para outro lugar é puxado. Mas, e se fizermos uma coisa de cada vez? O barco véio tá cansado, sobe o rio devagar. Você tem feito mudanças lentas, graduais e permanentes? Escreva nos comentários =]
“[…] A greve é legal, constitucional e absolutamente legítima, cabendo, como diz o art. 9 da Constituição Federal, aos trabalhadores decidirem a oportunidade de exercerem este secular direito e os interesses que devam por meio deste defender, o que é exatamente o que estão fazendo neste momento, com razão, os nossos carteiros e demais funcionários técnicos e administrativos do serviço postal brasileiro. O TST tem o dever de buscar a mediação e conciliação desta greve e não tratá-la com desdém ou preconceito, muito menos com ameaça de punições […]
Ao observar os números de Agosto de 2020 já sabíamos que seria um mês atípico. Afinal de contas, no início do mês decidimos parar por uma semana para cuidar de nossa saúde mental. No mesmo dia em que retornamos, foi decretada a greve de trabalhadoras e trabalhadores dos Correios. Em solidariedade às atendentes, carteiros e carteiras e OTT’s, paralisamos todos os nossos envios, ainda que as Agências Franqueadas e terceirizados estejam funcionando normalmente.
Evidentemente, com essas questões nosso ritmo de produção de livros caiu bastante, mas mantivemos a reposição de estoque de zines. Também adiantamos a impressão de 155 exemplares de nosso próximo lançamento e com isso o volume de impressões ficou maior que a quantidade de livros produzidos, o que provavelmente deve se manter em Setembro e ser normalizado em Outubro, no lançamento de “Zumbi dos Palmares: por uma educação antirracista“.
A partir de Agosto de 2020, todos os meses, o Instituto Bianca e Adrielle, em Belém do Pará, passará a receber um pacote de materiais da Monstro dos Mares através das amizades da Biblioteca Libertária Maxwell Ferreira.
Todos os meses a Editora Monstro dos Mares faz esse agradecimento às amizades que fortalecem nosso bonde e nos ajudam a atravessar os momentos difíceis e especialmente dramáticos como esse Agosto de 2020. Em função da pandemia, a manutenção da vida e das atividades da editora ficaram mais complexas. É compreensível que as pessoas não estejam priorizando o livro e as leituras nesse momento, então nossas vendas caíram bastante e cada real dos apoios nos ajudam muito, de verdade.
No início do mês ficamos uma semana fechados buscando cuidar de nossa saúde mental no auto-isolamento rigoroso que adotamos desde o dia 11 de Março. Quando retornamos às nossas atividades, foi decretada a greve da categoria de profissionais dos Correios (Carteiros e Carteiras, Atendentes e Operadoras e Operadores de Triagem e Transbordo, chamados de OTT’s). Nós apoiamos integralmente a mobilização contra o sequestro dos direitos e desmonte da empresa. Por isso, decidimos somar em solidariedade e não faremos nenhum envio enquanto a luta de trabalhadoras e trabalhadores manter a greve dos Correios.
A Editora Monstro dos Mares precisa da sua ajuda para continuar, contribua com a Rede de Apoio no Catarse ou PicPay e receba materiais impressos em sua casa. 🖨️
Um documentário que retoma as ideias de Frantz Fanon do passado e as coloca no caminho de como suas ideias estão ressoando com os jovens de hoje ao redor do planeta.
Quando Frantz Fanon estava nos últimos estágios da leucemia, aos 36 anos, ele foi levado para um hospital em Bethesda, Maryland, nos Estados Unidos, para uma cirurgia. Seu filho de 5 anos, Olivier, andando por lá e vendo a chegada de sangue para transfusão, vendo as bolsas de sangue, temeu que seu pai houvesse sido cortado em pedaços. O pequeno Olivier mais tarde encontrou flamulando uma bandeira da Argélia em uma rua desde a brutal e recorrente guerra Franco-Argelina, na qual ambos seus pais estiveram profundamente engajados. Esse era, até então, seu único entendimento de violência e sangue no mundo.
Eu me recordei desta história de partir o coração, incluída na biografia de Fanon feita por David Macey, durante a triagem do filme de Hassene Mezine, Fanon Hier, Aujourd’hui (Fanon: Ontem, hoje), com a participação de Olivier Fanon, agora adulto, lendo trechos do trabalho do pai. Entrevistas com ele e uma nota particularmente melancólica para o belamente composto sumário da vida de Fanon compõe a porção ‘ontem’ da primeira metade do filme. “Eu estava moldado em uma cena da Guerra da Argélia”. Olivier relata como foi viver marginalmente devido a ameaças constantes à vida de seu pai.
Mezine encerra a história de Fanon – a vida vivida desviantemente por um curto, enérgico e explosivo tempo – entre seu começo como um soldado lutando contra o nazismo aos 18 anos na II Guerra Mundial, até sua “última luta contra o colonialismo”. Aqui, o foco é nos dias em que Fanon esteve na Argélia, começando com seu posto em Blida, onde ele foi apontado como o médico-chefe no hospital psiquiátrico. Pegando a Estrada da recente publicação de Alienação e Liberdade: Frantz Fanon, na qual são recuperados e traduzidos a maioria de seus escritos psiquiátricos, o filme também se atenta ao trabalho psiquiátrico de Fanon no centro de seu pensamento anticolonial. Foi em Blida que ele estava disposto a tentar novas abordagens, métodos progressistas em um lugar e momento em que o colonialismo e o tratamento racista dos pacientes norte-africanos havia se tornado regra.
Fanon foi estagiário do Dr. Francois Tosquelles, que havia levantado a questão paradigmática, “Como você pode tratar pacientes se a instituição em si está doente?” e havia inventado a psiquiatria institucional. Levando estas ideias para mais longe, Fanon reorganizou completamente as atividades e tratamentos no hospital, incluindo arte terapia, música, sessões de contação de história, e até mesmo locais para arremessos e futebol. O filme alterna entre imagens antigas e novas do hospital em Blida, movendo de fotos ameaçadores de correntes, algemas e cintos para imagens de pessoas relaxando no café do hospital com o porta-retrato de Fanon pendurado em destaque na parede, evidência da longa permanência das mudanças estruturais que fez ali.
O filme toma o olhar por meio de Fanon no tempo em que era revolucionário na luta da Argélia até lentes íntimas e pessoais – histórias de amigos com quem se reunia nas refeições e tinha longas e agitadas discussões sobre a guerra; Fanon tocando guitarra e cantando nas festas de fim de ano, Fanon caminhando pelo seu quarto vazio, sem mobílias, no qual ele ditou seu livro todo para sua assistente Marie-Jean Manuellan; Fanon empurrando o pequeno Olivier em seu triciclo. Todos estes fragmentos de memória permitiram que o público acessasse o sociável, agradável e vibrante Fanon vivo – sendo sempre alguém com a comunidade, e que tinha energias ilimitadas e ideias sobre a luta colonial e as injustiças em todo lugar.
A inovação trazida por este documentário é simples: um curto retrato da companheira de Fanon em vida e amor, Josie. Resumido em um amor revolucionário, “Argélia serviu como catalisador para aproximar Fanon e minha mãe”, explica Olivier, “Ele estava lá nos campos de batalha, nas fronteiras”, acrescenta. Sem dúvida, Fanon, Josie e a Argélia eram indissociáveis.
Enquanto Josie Fanon foi deixada de lado pelos livros de história, esta curta homenagem faz o trabalho necessário de incitar e relembrar os especialistas em Fanon a avaliar a extensão em que a revolução é continuamente enquadrada como masculina, com as mulheres apenas tratadas como acessórios temporários para grandes projetos. Josie foi uma figura respeitada e amada que continuou o seu trabalho como jornalista na Argélia e foi uma forte aliada do movimento anti-apartheid na África do Sul, permanecendo essencialmente sem medo e engajada nas políticas até sua morte em 1989.
Após realizar muitas novas interações na biografia de Fanon, a sessão “hoje” mostra-se o ponto crucial do documentário. Ela contém a longa e robusta tese: a ideia de que o trabalho de Fanon tem sido transformador e influente, e que indubitavelmente possui radicalidade após sua vida.
Qual é, com tudo isso, a relevância de Fanon hoje? Diferente de Che Guevara, Fanon não se tornou um ícone de destaque. Não existem camisetas, broches, sacolas nas quais ele aparece, e isso é simplesmente porque as ideias de Fanon não são facilmente consumidas, nem servem para curtos e concisos lemas. Até como movimento de alerta para o direito global que agora cria raízes, que também tem ferocidades beligerantes e ideologia de resistência decolonial.
O documentário demonstra que Fanon tem muito o que oferecer para a juventude de hoje, que é privada de seus direitos pelas políticas econômicas neoliberais, alimentando o racismo pernicioso e profundamente radicalizado justamente devido à ampla disponibilidade online de uma lista de injustiças, desigualdades e corrupção no mundo. “Miséria é o único destino prometido para centenas de milhões de humanos”, a narradora Marie Tsakala estoicamente declara.
A jornada do filme começa na Martinica, local de nascimento de Fanon (onde o documentário exibe a audiência entusiasmada em um auditório massivamente lotado). Mezine estava surpreso em saber que o trabalho de Fanon era pouco conhecido na Martinica. Ademias, tal recepção ansiosa talvez evidenciasse que ali havia um desejo de olhar para além dos erros de estereótipo de Fanon como um “apóstolo da violência”, e a fome real de retomar suas ideias, que talvez possam oferecer respostas para problemas do presente.
Em Portugal, o rapper e ativista Flàvio Almada “LBC Soldjah” falou o quanto havia sido transformado por Pele Negra, Máscaras Brancas. O líder em “Plataforma Gueto”, um movimento social negro que inventa métodos para educação popular e construção comunitária, Almada reclama do racismo institucional e da violência policial contra a população negra arraigados em Portugal. Portanto, as noções fanonianas de que “nós nos revoltamos porque não podemos respirar” ressoam como urgentes. As ideias de Fanon são importantes porque ele ilumina o que não é culpa dos povos marginalizados, e que não são seus destinos, explica Almada, mas o racismo e a violência são ideologicamente organizados, e podem ser decolonizados, erradicados e superados.
Viajando para a França, África do Sul e Nigéria, o documentário pretendeu seguir a relevância de Fanon para a geração mais jovem intensamente consciente do fato de que o imperialismo continua inabalável em um rol de criativas e enganosas mutações. “Nós não somos os ‘condenados da terra’ falados por Fanon,” explica Houria Bouteldja ativista franco-argelino. “Nós somos os sujeitos pós-coloniais da Europa; nós somos o Sul no Norte.”
O próprio Hassane Mezine é muito o produto dessas ideias, e escolheu fazer este documentários por causa de sua “identidade argelina”, com a qual tinha conflitos enquanto crescia na França. Ele explica que é “confrontado com os mitos do republicanismo francês sobre justiça e igualdade, que não são realmente aplicados quando você nasceu fora, em uma colônia histórica francesa.” Para Bouteldja, assim como para Mezine, Fanon esclarece o processo como um colonialismo interno, e seus escritos oferecem estratégias para se decolonizar destas estruturas sufocantes.
Observações excepcionalmente fortes vêm do jovem ativista Ibrahima Diori em Niamey, Nigéria, que disse que as ideias fanonianas se tornaram particularmente relevantes em seu país pois ele tem um papel central na exacerbação do que chamam de “crise migratória”. As leis de divisão colonial entre a África Negra, a África Branca e o Norte da África evitam liberdades internas de movimentação; Como os chefes de Estado das nações norte-africanas se tornaram agentes das agendas europeias, fronteiras foram estendidas e se proliferaram ao longo da África, se tornando “um jogo de isolamento instituído pelas políticas anti-migratórias europeias.” Apesar das estatísticas que provam repetitivamente que a maioria dos migrantes não deseja entrar na Europa, mas pretende viajar livremente pela África, este discurso é promovido na mídia como uma justificação da draconiana e repressiva das políticas de fronteira.
Diori pleiteia a simplificação das relações entre os humanos, e Fanon oferece a ele uma ponte para os ideais de solidariedade e unidade. Salima Ghezali, jornalista e ativista, faz uma reflexão similar em Argel, Argélia, e fala em um discurso racista interno que tem sido combatido pelo grupo ao qual Fanon referiu-se como a corrupta “burguesia nacional” no contexto dos refugiados e migrantes oriundos da África.
Como a jornada de Fanon continua, parece claro que mulheres são a vanguarda dos movimentos de massa contemporâneos contra o racismo, ganância corporativa e colonialismo estrutural. Tal quadro fica ainda mais evidente quando Mexine termina com uma sessão na Palestina com Samah Jabr, que é uma das 22 pessoas exercendo a psiquiatria e a única mulher na profissão na Costa Oeste. Profundamente influenciada pelos escritos de Fanon, Jabr explica que “o trauma descrito nos manuais ocidentais não parece similar ao trauma que temos na Palestina.” Ela compara um grupo oprimido com uma sobrevivente de estupro que se culpa pelo estupro e imagina que ela inicialmente mereceu isso. Um grupo oprimido como os Palestinos tem que superar seu imenso complexo de inferioridade, e atuam inspirados pelo potencial terapêutico das teorias de Fanon, acrescenta Jabr. Em um movimento de poder simbólico, Mezine projeta as palavras de Fanon no rosto radiante de Ahed Tamimi, uma garota adolescente que já foi presa por seu confronto com os soldados israelenses, incitando manifestações e protestos globais.
De fato, Mezine inaugura Fanon na geração do século XXI que, talvez, nunca conheceram o colonialismo propriamente dito, mas tem herdado todas as suas duráveis brutalidades. Almada de Portugal insiste que “ativistas, rappers e acadêmicos devem ler Fanon, mas não o transformar em algo da moda. Fanon é para a libertação.” Em outro lugar, as palavras hipnotizantes de Cornel West para a câmera permanecem conosco: “Muitos do mundo pré-fanoniano persiste. Mas nós vamos conversar com Frantz Fanon porque muitos de nós decidimos que queremos ser fiéis até a morte as verdades ditas por eles, aos seus testemunhos…”
Como o esforço melancólico de Yazid Fentazi´s oud, que nos acompanhou por todo o documentário, agora deixa aos músicos Neyssatou da Tunísia que bravamente imersos por “War” de Bob Marley, há um senso de júbilo. A missão talvez ainda não esteja complete, mas a saga foi iniciada e o trabalho da decolonização libertária está encampada seriamente por todo o planeta.
Por Bhakti Shringarpure em Africa Is a Country. Gentilmente traduzido por Ste.
Em “Zumbi dos Palmares: por uma educação antirracista“, Walter Vadala articula as possibilidades de encontros e diálogos que emergem a partir da história de Zumbi para que educadoras e educadores possam compreender e combater o racismo utilizando-se da educação como mediadora e fazendo da escola mais que um ambiente de conhecimento teórico, mas um ambiente de transformação social.
A Monstro dos Mares tem entre seus princípios a tarefa de disponibilizar exemplares impressos a bibliotecas comunitárias, coletivos, movimentos e centros sociais que, entre suas práticas, promovem uma educação libertária, antirracista e que questionam o padrão eurocêntrico dentro e fora das salas de aula. A função de nosso bonde editorial é fazer do livro uma ferramenta de luta contra o capitalismo, a colonialidade e o patriarcado em todas as suas expressões. Para a publicação de “Zumbi dos Palmares: por uma educação antirracista“, vamos fortalecer as seguintes coletividades:
Biblioteca comunitária de Parelheiros (São Paulo – SP)
Biblioteca Comunitária Livro Livre Curió (Fortaleza – CE)
Rádio Comunitária A Voz do Morro (Porto Alegre – RS)
Rádio Comunitária Aconchego (Recife – PE)
CCS Vila Dalva (São Paulo – SP)
Para que muitos exemplares possam chegar nesses espaços precisamos da sua participação. Ao apoiar com valores a partir de 10 reais ou recomendar a campanha de financiamento coletivo do livro para suas amizades, você estará fortalecendo a distribuição de materiais que vão fortalecer efetivamente a luta cotidiana de quem faz educação.
“Zumbi dos Palmares: por uma educação antirracista” – para apoiar o projeto acesse: catarse.me/zumbidospalmares
O processo de publicação de um livro exige a participação de muitas pessoas. Para colocar as ideias para circular, Vadala contou com a colaboração de Monica Marques, que fez a diagramação e criou as belas e poderosas ilustrações que compõem o livro. Também estão neste projeto o carinho e atenção de Luciana Teixeira Morais, que fez a revisão, e os generosos conhecimentos do bibliotecário e ativista Paulo R. Freitas, que contribuiu com a ficha catalográfica e aspectos formais de registro do material. Aqui na Monstro, nosso compa Da Vinci ajuda nas rotinas de mídias sociais, Baderna James como assistente editorial (e impressão) e abobrinha como editora geral do projeto (e montagem). Com a sua participação, vamos debelar os limites físicos e sociais dos muros que cercam as universidades e formam verdadeiros abismos entre comunidade e conhecimento.
Já faz seis meses que a Pandemia do Novo Coronavirus chegou ao Brasil e América Latina. É possível que cada uma de nós já tenha desenvolvido estratégias para lidar com o vírus, adotando um protocolo de segurança que atenda minimamente as necessidades mais básicas. Sabemos que, infelizmente, um dos principais sintomas dessa doença é escancarar as diferenças. Por isso, é importante reconhecer que algumas pessoas não conseguem manter os mesmos cuidados por diversos fatores, que são essencialmente sociais. Sabemos que os impactos sanitários, ambientais e sociais desse período modificarão profundamente os modos de viver e existir das próximas gerações.
É importante que cada pessoa apoie, dentro de suas possibilidades, as campanhas de apoio mútuo mobilizadas por diversas iniciativas, que seguem surgindo nesse tempo infeliz de descaso governamental.
Algumas pessoas, ainda que com dificuldades, optaram pelo auto-isolamento. Essa é uma forma de “distanciamento social” que busca evitar a circulação de pessoas e, com isso, reduzir ao máximo as chances de contágio e transmissão do vírus. Sabemos que esse método de prevenção envolve uma série de questões que precisam ser problematizadas AGORA. De que forma e em que condições é possível manter esse isolamento sem ignorar a realidade brasileira?
O objetivo deste texto não é expor as contradições envolvidas nessa escolha, mas reconhecer que, em diferentes modelos, um auto-isolamento é possível, seguro e pode ser solidário. Além disso, de alguma maneira pode ser útil para a auto-instrução e para a promoção de novos conhecimentos.
Você deve ter notado uma oferta imensa de cursos e lives com debates interessantíssimos, grupos de estudos on-line e projetos que recebem a adesão de variados perfis. Nossas amizades também estão promovendo momentos de encontro com artistas, músicos, performances e outras atividades artísticas e de compartilhamento de conhecimentos como nunca havia sido visto.
É bem possível que, se você leu até aqui, muito provavelmente já assistiu algum desses eventos, já recebeu o convite para participar de alguma live, um podcast ou, até mesmo, em algum momento já promoveu seu próprio evento. Por isso podemos ter essa conversa, pois já entendemos que alguma coisa temos em comum.
Auto-isolamento / auto-instrução
Para ampliar nossos conhecimentos e contribuir no desenvolvimento de uma autodefesa legítima contra a ideologia hegemônica do estado, do grande capital e do patriarcado, precisamos de uma programa de educação política capaz de romper com as lógicas de dominação e fazer com que nossas visões de mundo abram um espaço de possibilidade em nossos enfrentamentos cotidianos.
Nós, que nos reconhecemos como pessoas identificadas com políticas radicais e revolucionárias, precisamos construir ferramentas práticas para que nossas ideias e críticas possam emergir das realidades às quaisque estamos condicionadas, especialmente durante a pandemia. É preciso estilhaçar as ideias do senso comum e desenvolver dentro de nós a coragem necessária para que nossas convicções e capacidades de ação possam fortalecer uma resposta autônoma e autogestionária, compartilhando dos princípios e éticas libertários aos problemas impostos pelo Covid-19 ou agravados por ele.
Pensando em tudo isso, seguem abaixo algumas dicas para realizar momentos de leitura no seu dia a dia, só ou com seu bando.
Ideias e sugestões para seu programa de auto-instrução
Ler (ou reler) obras de uma autora ou ator do seu interesse, em ordem cronológica;
Ler um livro junto com uma amizade e promover encontros on-line para trocar ideias a cada capítulo;
Combinar a leitura de um texto literário com textos e teóricos que dialogam com a obra;
Fazer uma ampla seleção de documentários e filmes de ficção sobre um tema;
Pesquisar artigos acadêmicos, livros, zines e panfletos sobre um tema de seu interesse ou de algo absolutamente novo para você e seu bando. Anticolonialismo, agroecologia libertária, solarpunk, teoria queer, feminismo negro, epicurismo, arrombamento de fechaduras e segurança digital são ótimos exemplos de temas;
Transitar entre diferentes escolas e movimentos literários e sociais;
Criar uma playlist de músicas que tratam sobre o tema de sua pesquisa e, na sequência, pensar sobre as letras e o contexto social da época de lançamento;
Reservar um horário para leitura sem muitas interrupções;
Navegar por sites estrangeiros de editoras e livrarias;
Acessar a Biblioteca Anarquista Lusófona e conhecer os diversos textos disponíveis;
Explorar formatos e gêneros, alternando histórias em quadrinhos, contos, romances, etc;
Ler obras de autoras e autores que você sempre considerou impossíveis ou inacessíveis;
Fazer um cineclube virtual para assistir filmes e debater com co-residentes e familiares, utilizando recursos de videochamada ou mensagens de texto/áudio;
Ler o livro, assistir ao filme e discutir a adaptação;
Criar um zine;
Organizar sua biblioteca/coleção (vale a pasta de PDF);
Compartilhar seus títulos preferidos com suas amizades, para depois organizar leituras em grupo;
Crar sua própria estratégia de leitura.
Utilizar o tempo de auto-isolamento como um tempo útil e necessário para que seja possível fortalecer nossas visões de mundo e apontar direções para além do atual estado de coisas. Se manter o isolamento é viável para você, considere fazer um programa de estudos, um plano de zines, livros e capítulos que podem articular respostas para as dúvidas que movimentam suas inquietação e que te fazem perguntar como será possível fazermos, com nossas mãos, um século 21 absolutamente diferente.
Esse evento é organizado pelo Projeto de Pesquisa (In)visibilidades, Identidades e Diferenças: raça, gênero, sexualidades e outras interseccionalidades na memória cultural, literária dos contextos pós/de(s)-coloniais ou no sul global, da Universidade Federal Rural da Amazônia (Tomé-Açu/PA). O projeto é coordenado pelo professor Marcelo Spitzner, autor de Judith Butler & Michel Foucault: considerações em torno da performatividade, do discurso e da constituição do sujeito.
A Numerologia de Julho de 2020 marca a chegada de novos títulos em nosso catálogo e dias em que pudemos colocar em pauta outras atividades, estar em contato com autoras e autores, pessoas que colaboram em traduções e realizar pesquisas. Recebemos a colaboração de publicações no blog, o que reforça a importância do conteúdo e cuidados com detalhes que são importantes.
Na primeira quinzena de Julho assistimos ao documentário “Ligue Djá: O Lendário Walter Mercado“, que apresentou de modo sensível e bem produzido a biografia de Walter Mercado. Na hora, pensei em utilizar o bordão que dá origem ao título documentário em língua espanhola na publicação sobre nossos números mensais, carinhosamente chamado de Numerologia.
O “Chá da tarde” evento on-line de perguntas e respostas com nossa editora geral, abobrinha, marcou significativamente esse mês por tratar de temas que muitas vezes não são evidentes para quem acompanha o cotidiano de uma editora autônoma e artesanal. Existem muitas outras questões além de tinta e papel. Também é necessário saber conviver, compartilhar e compreender quem está conosco nessa ideia maluca de fazer livros.
Walter Mercado se despedia desejando aquilo que é mais importante na vida, e uma grande motivação para todes nós.