Rede de Apoio: Agosto de 2020 (um agradecimento especial)

Todos os meses a Editora Monstro dos Mares faz esse agradecimento às amizades que fortalecem nosso bonde e nos ajudam a atravessar os momentos difíceis e especialmente dramáticos como esse Agosto de 2020. Em função da pandemia, a manutenção da vida e das atividades da editora ficaram mais complexas. É compreensível que as pessoas não estejam priorizando o livro e as leituras nesse momento, então nossas vendas caíram bastante e cada real dos apoios nos ajudam muito, de verdade.

No início do mês ficamos uma semana fechados buscando cuidar de nossa saúde mental no auto-isolamento rigoroso que adotamos desde o dia 11 de Março. Quando retornamos às nossas atividades, foi decretada a greve da categoria de profissionais dos Correios (Carteiros e Carteiras, Atendentes e Operadoras e Operadores de Triagem e Transbordo, chamados de OTT’s). Nós apoiamos integralmente a mobilização contra o sequestro dos direitos e desmonte da empresa. Por isso, decidimos somar em solidariedade e não faremos nenhum envio enquanto a luta de trabalhadoras e trabalhadores manter a greve dos Correios.

Para agradecer monas, minas e manos que apoiam nossa Rede de Apoio no Catarse e no PicPay, que pacientemente vão esperar seus pacotes serem enviados depois da greve, nós vamos enviar o livro “Como dois rios que caminham ao contrário: um ensaio reflexivo com os guarani sobre desenvolvimento”, de Yan Chaparro e Josemar Nascimento, lançado recentemente por nossas amizades da editora Terra Sem Amos (TSA), a quem agradecemos imensamente o carinho e as trocas de ideias/lamentações.

Nosso muito obrigado!

  • Caio
  • Camila
  • Willian Aust
  • Leo Foletto
  • Nicolas Mosko
  • Viviane Kelly Silva
  • R.
  • Eduardo Salazar Miranda da Conceição Mattos
  • Enguia
  • Ricardo Mayer
  • Fernando Silva e Silva
  • Mauricio Marin
  • Roque Marciano
  • Lua Clara Jacira
  • Lupi
  • Adriano Gatti Mesquita Cavalcanti
  • Andressa França Arellano
  • Anna Karina
  • Vic
  • Doro
  • Karine Tressler
  • Andrei Cerentini
  • José Antônio de Castro Cavalcanti
  • Fyb C
  • Lorenzo
  • Gabriel Jung do Amaral
  • Mayumi Horibe
  • Phanta
  • Guapo
  • Ste
  • Márcio Massula
  • Apoiadoras e apoiadores anônimos.

A Editora Monstro dos Mares precisa da sua ajuda para continuar, contribua com
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A radical pós-vida de Frantz Fanon

Um documentário que retoma as ideias de Frantz Fanon do passado e as coloca no caminho de como suas ideias estão ressoando com os jovens de hoje ao redor do planeta.

Quando Frantz Fanon estava nos últimos estágios da leucemia, aos 36 anos, ele foi levado para um hospital em Bethesda, Maryland, nos Estados Unidos, para uma cirurgia. Seu filho de 5 anos, Olivier, andando por lá e vendo a chegada de sangue para transfusão, vendo as bolsas de sangue, temeu que seu pai houvesse sido cortado em pedaços. O pequeno Olivier mais tarde encontrou flamulando uma bandeira da Argélia em uma rua desde a brutal e recorrente guerra Franco-Argelina, na qual ambos seus pais estiveram profundamente engajados. Esse era, até então, seu único entendimento de violência e sangue no mundo.

Eu me recordei desta história de partir o coração, incluída na biografia de Fanon feita por David Macey, durante a triagem do filme de Hassene Mezine, Fanon Hier, Aujourd’hui (Fanon: Ontem, hoje), com a participação de Olivier Fanon, agora adulto, lendo trechos do trabalho do pai. Entrevistas com ele e uma nota particularmente melancólica para o belamente composto sumário da vida de Fanon compõe a porção ‘ontem’ da primeira metade do filme. “Eu estava moldado em uma cena da Guerra da Argélia”. Olivier relata como foi viver marginalmente devido a ameaças constantes à vida de seu pai.

Mezine encerra a história de Fanon – a vida vivida desviantemente por um curto, enérgico e explosivo tempo – entre seu começo como um soldado lutando contra o nazismo aos 18 anos na II Guerra Mundial, até sua “última luta contra o colonialismo”. Aqui, o foco é nos dias em que Fanon esteve na Argélia, começando com seu posto em Blida, onde ele foi apontado como o médico-chefe no hospital psiquiátrico. Pegando a Estrada da recente publicação de Alienação e Liberdade: Frantz Fanon, na qual são recuperados e traduzidos a maioria de seus escritos psiquiátricos, o filme também se atenta ao trabalho psiquiátrico de Fanon no centro de seu pensamento anticolonial. Foi em Blida que ele estava disposto a tentar novas abordagens, métodos progressistas em um lugar e momento em que o colonialismo e o tratamento racista dos pacientes norte-africanos havia se tornado regra.

Fanon foi estagiário do Dr. Francois Tosquelles, que havia levantado a questão paradigmática, “Como você pode tratar pacientes se a instituição em si está doente?” e havia inventado a psiquiatria institucional. Levando estas ideias para mais longe, Fanon reorganizou completamente as atividades e tratamentos no hospital, incluindo arte terapia, música, sessões de contação de história, e até mesmo locais para arremessos e futebol. O filme alterna entre imagens antigas e novas do hospital em Blida, movendo de fotos ameaçadores de correntes, algemas e cintos para imagens de pessoas relaxando no café do hospital com o porta-retrato de Fanon pendurado em destaque na parede, evidência da longa permanência das mudanças estruturais que fez ali.

O filme toma o olhar por meio de Fanon no tempo em que era revolucionário na luta da Argélia até lentes íntimas e pessoais – histórias de amigos com quem se reunia nas refeições e tinha longas e agitadas discussões sobre a guerra; Fanon tocando guitarra e cantando nas festas de fim de ano, Fanon caminhando pelo seu quarto vazio, sem mobílias, no qual ele ditou seu livro todo para sua assistente Marie-Jean Manuellan; Fanon empurrando o pequeno Olivier em seu triciclo. Todos estes fragmentos de memória permitiram que o público acessasse o sociável, agradável e vibrante Fanon vivo – sendo sempre alguém com a comunidade, e que tinha energias ilimitadas e ideias sobre a luta colonial e as injustiças em todo lugar.

Frantz Fanon brincando com criança

A inovação trazida por este documentário é simples: um curto retrato da companheira de Fanon em vida e amor, Josie. Resumido em um amor revolucionário, “Argélia serviu como catalisador para aproximar Fanon e minha mãe”, explica Olivier, “Ele estava lá nos campos de batalha, nas fronteiras”, acrescenta. Sem dúvida, Fanon, Josie e a Argélia eram indissociáveis.

Enquanto Josie Fanon foi deixada de lado pelos livros de história, esta curta homenagem faz o trabalho necessário de incitar e relembrar os especialistas em Fanon a avaliar a extensão em que a revolução é continuamente enquadrada como masculina, com as mulheres apenas tratadas como acessórios temporários para grandes projetos. Josie foi uma figura respeitada e amada que continuou o seu trabalho como jornalista na Argélia e foi uma forte aliada do movimento anti-apartheid na África do Sul, permanecendo essencialmente sem medo e engajada nas políticas até sua morte em 1989.

Após realizar muitas novas interações na biografia de Fanon, a sessão “hoje” mostra-se o ponto crucial do documentário. Ela contém a longa e robusta tese: a ideia de que o trabalho de Fanon tem sido transformador e influente, e que indubitavelmente possui radicalidade após sua vida.

Qual é, com tudo isso, a relevância de Fanon hoje? Diferente de Che Guevara, Fanon não se tornou um ícone de destaque. Não existem camisetas, broches, sacolas nas quais ele aparece, e isso é simplesmente porque as ideias de Fanon não são facilmente consumidas, nem servem para curtos e concisos lemas. Até como movimento de alerta para o direito global que agora cria raízes, que também tem ferocidades beligerantes e ideologia de resistência decolonial.

O documentário demonstra que Fanon tem muito o que oferecer para a juventude de hoje, que é privada de seus direitos pelas políticas econômicas neoliberais, alimentando o racismo pernicioso e profundamente radicalizado justamente devido à ampla disponibilidade online de uma lista de injustiças, desigualdades e corrupção no mundo. “Miséria é o único destino prometido para centenas de milhões de humanos”, a narradora Marie Tsakala estoicamente declara.

A jornada do filme começa na Martinica, local de nascimento de Fanon (onde o documentário exibe a audiência entusiasmada em um auditório massivamente lotado). Mezine estava surpreso em saber que o trabalho de Fanon era pouco conhecido na Martinica. Ademias, tal recepção ansiosa talvez evidenciasse que ali havia um desejo de olhar para além dos erros de estereótipo de Fanon como um “apóstolo da violência”, e a fome real de retomar suas ideias, que talvez possam oferecer respostas para problemas do presente.

Em Portugal, o rapper e ativista Flàvio Almada “LBC Soldjah” falou o quanto havia sido transformado por Pele Negra, Máscaras Brancas. O líder em “Plataforma Gueto”, um movimento social negro que inventa métodos para educação popular e construção comunitária, Almada reclama do racismo institucional e da violência policial contra a população negra arraigados em Portugal. Portanto, as noções fanonianas de que “nós nos revoltamos porque não podemos respirar” ressoam como urgentes. As ideias de Fanon são importantes porque ele ilumina o que não é culpa dos povos marginalizados, e que não são seus destinos, explica Almada, mas o racismo e a violência são ideologicamente organizados, e podem ser decolonizados, erradicados e superados.

Viajando para a França, África do Sul e Nigéria, o documentário pretendeu seguir a relevância de Fanon para a geração mais jovem intensamente consciente do fato de que o imperialismo continua inabalável em um rol de criativas e enganosas mutações. “Nós não somos os ‘condenados da terra’ falados por Fanon,” explica Houria Bouteldja ativista franco-argelino. “Nós somos os sujeitos pós-coloniais da Europa; nós somos o Sul no Norte.”

imagem do Espaço Frantz Fanon

O próprio Hassane Mezine é muito o produto dessas ideias, e escolheu fazer este documentários por causa de sua “identidade argelina”, com a qual tinha conflitos enquanto crescia na França. Ele explica que é “confrontado com os mitos do republicanismo francês sobre justiça e igualdade, que não são realmente aplicados quando você nasceu fora, em uma colônia histórica francesa.” Para Bouteldja, assim como para Mezine, Fanon esclarece o processo como um colonialismo interno, e seus escritos oferecem estratégias para se decolonizar destas estruturas sufocantes.

Observações excepcionalmente fortes vêm do jovem ativista Ibrahima Diori em Niamey, Nigéria, que disse que as ideias fanonianas se tornaram particularmente relevantes em seu país pois ele tem um papel central na exacerbação do que chamam de “crise migratória”. As leis de divisão colonial entre a África Negra, a África Branca e o Norte da África evitam liberdades internas de movimentação; Como os chefes de Estado das nações norte-africanas se tornaram agentes das agendas europeias, fronteiras foram estendidas e se proliferaram ao longo da África, se tornando “um jogo de isolamento instituído pelas políticas anti-migratórias europeias.” Apesar das estatísticas que provam repetitivamente que a maioria dos migrantes não deseja entrar na Europa, mas pretende viajar livremente pela África, este discurso é promovido na mídia como uma justificação da draconiana e repressiva das políticas de fronteira.

Diori pleiteia a simplificação das relações entre os humanos, e Fanon oferece a ele uma ponte para os ideais de solidariedade e unidade. Salima Ghezali, jornalista e ativista, faz uma reflexão similar em Argel, Argélia, e fala em um discurso racista interno que tem sido combatido pelo grupo ao qual Fanon referiu-se como a corrupta “burguesia nacional” no contexto dos refugiados e migrantes oriundos da África.

Como a jornada de Fanon continua, parece claro que mulheres são a vanguarda dos movimentos de massa contemporâneos contra o racismo, ganância corporativa e colonialismo estrutural. Tal quadro fica ainda mais evidente quando Mexine termina com uma sessão na Palestina com Samah Jabr, que é uma das 22 pessoas exercendo a psiquiatria e a única mulher na profissão na Costa Oeste. Profundamente influenciada pelos escritos de Fanon, Jabr explica que “o trauma descrito nos manuais ocidentais não parece similar ao trauma que temos na Palestina.” Ela compara um grupo oprimido com uma sobrevivente de estupro que se culpa pelo estupro e imagina que ela inicialmente mereceu isso. Um grupo oprimido como os Palestinos tem que superar seu imenso complexo de inferioridade, e atuam inspirados pelo potencial terapêutico das teorias de Fanon, acrescenta Jabr. Em um movimento de poder simbólico, Mezine projeta as palavras de Fanon no rosto radiante de Ahed Tamimi, uma garota adolescente que já foi presa por seu confronto com os soldados israelenses, incitando manifestações e protestos globais.

De fato, Mezine inaugura Fanon na geração do século XXI que, talvez, nunca conheceram o colonialismo propriamente dito, mas tem herdado todas as suas duráveis brutalidades. Almada de Portugal insiste que “ativistas, rappers e acadêmicos devem ler Fanon, mas não o transformar em algo da moda. Fanon é para a libertação.” Em outro lugar, as palavras hipnotizantes de Cornel West para a câmera permanecem conosco: “Muitos do mundo pré-fanoniano persiste. Mas nós vamos conversar com Frantz Fanon porque muitos de nós decidimos que queremos ser fiéis até a morte as verdades ditas por eles, aos seus testemunhos…”

Como o esforço melancólico de Yazid Fentazi´s oud, que nos acompanhou por todo o documentário, agora deixa aos músicos Neyssatou da Tunísia que bravamente imersos por “War” de Bob Marley, há um senso de júbilo. A missão talvez ainda não esteja complete, mas a saga foi iniciada e o trabalho da decolonização libertária está encampada seriamente por todo o planeta.

Por Bhakti Shringarpure em Africa Is a Country.
Gentilmente traduzido por Ste.


Participe do financiamento coletivo do livro “Zumbi dos Palmares: por uma educação antirracista”, de Walter Vadala

Em “Zumbi dos Palmares: por uma educação antirracista“, Walter Vadala articula as possibilidades de encontros e diálogos que emergem a partir da história de Zumbi para que educadoras e educadores possam compreender e combater o racismo utilizando-se da educação como mediadora e fazendo da escola mais que um ambiente de conhecimento teórico, mas um ambiente de transformação social.

A Monstro dos Mares tem entre seus princípios a tarefa de disponibilizar exemplares impressos a bibliotecas comunitárias, coletivos, movimentos e centros sociais que, entre suas práticas, promovem uma educação libertária, antirracista e que questionam o padrão eurocêntrico dentro e fora das salas de aula. A função de nosso bonde editorial é fazer do livro uma ferramenta de luta contra o capitalismo, a colonialidade e o patriarcado em todas as suas expressões. Para a publicação de “Zumbi dos Palmares: por uma educação antirracista“, vamos fortalecer as seguintes coletividades:

  • Biblioteca comunitária de Parelheiros (São Paulo – SP)
  • Biblioteca Comunitária Livro Livre Curió (Fortaleza – CE)
  • Biblioteca Libertária Maxwell Ferreira (Belém – PA)
  • CIEJA Campo Limpo (São Paulo – SP)
  • Quilombo das Artes (Porto Alegre – RS)
  • Frente Quilombola RS (Porto Alegre – RS)
  • Anarquistas contra o Racismo
  • Coletivo Cultura Viva (São Paulo – SP)
  • Rádio Comunitária A Voz do Morro (Porto Alegre – RS)
  • Rádio Comunitária Aconchego (Recife – PE)
  • CCS Vila Dalva (São Paulo – SP)

Para que muitos exemplares possam chegar nesses espaços precisamos da sua participação. Ao apoiar com valores a partir de 10 reais ou recomendar a campanha de financiamento coletivo do livro para suas amizades, você estará fortalecendo a distribuição de materiais que vão fortalecer efetivamente a luta cotidiana de quem faz educação.

“Zumbi dos Palmares: por uma educação antirracista” – para apoiar o projeto acesse: catarse.me/zumbidospalmares

O processo de publicação de um livro exige a participação de muitas pessoas. Para colocar as ideias para circular, Vadala contou com a colaboração de Monica Marques, que fez a diagramação e criou as belas e poderosas ilustrações que compõem o livro. Também estão neste projeto o carinho e atenção de Luciana Teixeira Morais, que fez a revisão, e os generosos conhecimentos do bibliotecário e ativista Paulo R. Freitas, que contribuiu com a ficha catalográfica e aspectos formais de registro do material. Aqui na Monstro, nosso compa Da Vinci ajuda nas rotinas de mídias sociais, Baderna James como assistente editorial (e impressão) e abobrinha como editora geral do projeto (e montagem). Com a sua participação, vamos debelar os limites físicos e sociais dos muros que cercam as universidades e formam verdadeiros abismos entre comunidade e conhecimento.

Pandemia Covid-19: utilize o auto-isolamento para sua auto-instrução

Já faz seis meses que a Pandemia do Novo Coronavirus chegou ao Brasil e América Latina. É possível que cada uma de nós já tenha desenvolvido estratégias para lidar com o vírus, adotando um protocolo de segurança que atenda minimamente as necessidades mais básicas. Sabemos que, infelizmente, um dos principais sintomas dessa doença é escancarar as diferenças. Por isso, é importante reconhecer que algumas pessoas não conseguem manter os mesmos cuidados por diversos fatores, que são essencialmente sociais. Sabemos que os impactos sanitários, ambientais e sociais desse período modificarão profundamente os modos de viver e existir das próximas gerações.

É importante que cada pessoa apoie, dentro de suas possibilidades, as campanhas de apoio mútuo mobilizadas por diversas iniciativas, que seguem surgindo nesse tempo infeliz de descaso governamental.

Algumas pessoas, ainda que com dificuldades, optaram pelo auto-isolamento. Essa é uma forma de “distanciamento social” que busca evitar a circulação de pessoas e, com isso, reduzir ao máximo as chances de contágio e transmissão do vírus. Sabemos que esse método de prevenção envolve uma série de questões que precisam ser problematizadas AGORA. De que forma e em que condições é possível manter esse isolamento sem ignorar a realidade brasileira?

O objetivo deste texto não é expor as contradições envolvidas nessa escolha, mas reconhecer que, em diferentes modelos, um auto-isolamento é possível, seguro e pode ser solidário. Além disso, de alguma maneira pode ser útil para a auto-instrução e para a promoção de novos conhecimentos.

Você deve ter notado uma oferta imensa de cursos e lives com debates interessantíssimos, grupos de estudos on-line e projetos que recebem a adesão de variados perfis. Nossas amizades também estão promovendo momentos de encontro com artistas, músicos, performances e outras atividades artísticas e de compartilhamento de conhecimentos como nunca havia sido visto.

É bem possível que, se você leu até aqui, muito provavelmente já assistiu algum desses eventos, já recebeu o convite para participar de alguma live, um podcast ou, até mesmo, em algum momento já promoveu seu próprio evento. Por isso podemos ter essa conversa, pois já entendemos que alguma coisa temos em comum.

Auto-isolamento / auto-instrução

Para ampliar nossos conhecimentos e contribuir no desenvolvimento de uma autodefesa legítima contra a ideologia hegemônica do estado, do grande capital e do patriarcado, precisamos de uma programa de educação política capaz de romper com as lógicas de dominação e fazer com que nossas visões de mundo abram um espaço de possibilidade em nossos enfrentamentos cotidianos.

Nós, que nos reconhecemos como pessoas identificadas com políticas radicais e revolucionárias, precisamos construir ferramentas práticas para que nossas ideias e críticas possam emergir das realidades às quaisque estamos condicionadas, especialmente durante a pandemia. É preciso estilhaçar as ideias do senso comum e desenvolver dentro de nós a coragem necessária para que nossas convicções e capacidades de ação possam fortalecer uma resposta autônoma e autogestionária, compartilhando dos princípios e éticas libertários aos problemas impostos pelo Covid-19 ou agravados por ele.

Pensando em tudo isso, seguem abaixo algumas dicas para realizar momentos de leitura no seu dia a dia, só ou com seu bando.

Ideias e sugestões para seu programa de auto-instrução

  • Ler (ou reler) obras de uma autora ou ator do seu interesse, em ordem cronológica;
  • Ler um livro junto com uma amizade e promover encontros on-line para trocar ideias a cada capítulo;
  • Combinar a leitura de um texto literário com textos e teóricos que dialogam com a obra;
  • Fazer uma ampla seleção de documentários e filmes de ficção sobre um tema;
  • Pesquisar artigos acadêmicos, livros, zines e panfletos sobre um tema de seu interesse ou de algo absolutamente novo para você e seu bando. Anticolonialismo, agroecologia libertária, solarpunk, teoria queer, feminismo negro, epicurismo, arrombamento de fechaduras e segurança digital são ótimos exemplos de temas;
  • Transitar entre diferentes escolas e movimentos literários e sociais;
  • Criar uma playlist de músicas que tratam sobre o tema de sua pesquisa e, na sequência, pensar sobre as letras e o contexto social da época de lançamento;
  • Reservar um horário para leitura sem muitas interrupções;
  • Navegar por sites estrangeiros de editoras e livrarias;
  • Acessar a Biblioteca Anarquista Lusófona e conhecer os diversos textos disponíveis;
  • Explorar formatos e gêneros, alternando histórias em quadrinhos, contos, romances, etc;
  • Ler obras de autoras e autores que você sempre considerou impossíveis ou inacessíveis;
  • Fazer um cineclube virtual para assistir filmes e debater com co-residentes e familiares, utilizando recursos de videochamada ou mensagens de texto/áudio;
  • Ler o livro, assistir ao filme e discutir a adaptação;
  • Criar um zine;
  • Organizar sua biblioteca/coleção (vale a pasta de PDF);
  • Compartilhar seus títulos preferidos com suas amizades, para depois organizar leituras em grupo;
  • Crar sua própria estratégia de leitura.

Utilizar o tempo de auto-isolamento como um tempo útil e necessário para que seja possível fortalecer nossas visões de mundo e apontar direções para além do atual estado de coisas. Se manter o isolamento é viável para você, considere fazer um programa de estudos, um plano de zines, livros e capítulos que podem articular respostas para as dúvidas que movimentam suas inquietação e que te fazem perguntar como será possível fazermos, com nossas mãos, um século 21 absolutamente diferente.

Algo novo está em ebulição, bote para ferver!

Solidary Tea

[Roda de conversa online] Interseccionalidades: queer, anarquismo e pandemia

No dia 12 de Agosto às 16h acontecerá a roda de conversa online Interseccionalidades: queer, anarquismo e pandemia, que contará com a presença de Daniel Santos da Silva, autor de Sem lamentações: filosofia, anarquismo e outros ensaios, e Claudia Mayer, autora de queer no Brasil: resistência e empoderamento na (re/a)presentação de si e Editora Geral da Monstro dos Mares.

As inscrições podem ser realizadas em:
https://sigaa.ufra.edu.br/sigaa/public/extensao/consulta_extensao.jsf

Esse evento é organizado pelo Projeto de Pesquisa (In)visibilidades, Identidades e Diferenças: raça, gênero, sexualidades e outras interseccionalidades na memória cultural, literária dos contextos pós/de(s)-coloniais ou no sul global, da Universidade Federal Rural da Amazônia (Tomé-Açu/PA). O projeto é coordenado pelo professor Marcelo Spitzner, autor de Judith Butler & Michel Foucault: considerações em torno da performatividade, do discurso e da constituição do sujeito.

O encontro também fará parte do I Congresso Internacional de Estudos Multidisciplinares na Amazônia, que acontecerá online nos dias 10, 11 e 12 de Agosto. As inscrições irão até o dia 07/08 e podem ser realizadas no site do evento.


Numerologia de Julho de 2020: mucho, mucho amor! 📞

A Numerologia de Julho de 2020 marca a chegada de novos títulos em nosso catálogo e dias em que pudemos colocar em pauta outras atividades, estar em contato com autoras e autores, pessoas que colaboram em traduções e realizar pesquisas. Recebemos a colaboração de publicações no blog, o que reforça a importância do conteúdo e cuidados com detalhes que são importantes.

Na primeira quinzena de Julho assistimos ao documentário “Ligue Djá: O Lendário Walter Mercado“, que apresentou de modo sensível e bem produzido a biografia de Walter Mercado. Na hora, pensei em utilizar o bordão que dá origem ao título documentário em língua espanhola na publicação sobre nossos números mensais, carinhosamente chamado de Numerologia.

O “Chá da tarde” evento on-line de perguntas e respostas com nossa editora geral, abobrinha, marcou significativamente esse mês por tratar de temas que muitas vezes não são evidentes para quem acompanha o cotidiano de uma editora autônoma e artesanal. Existem muitas outras questões além de tinta e papel. Também é necessário saber conviver, compartilhar e compreender quem está conosco nessa ideia maluca de fazer livros.

Walter Mercado se despedia desejando aquilo que é mais importante na vida, e uma grande motivação para todes nós.

“Mucho, mucho Amor!”


Numerologia de Julho de 2020

Numerologia de Julho de 2020

  • Impressões de Julho de 2020: 23.287
  • Livros impressos: 261
  • Livros distribuição gratuita: 84
  • Zines impressos: 564
  • Zines distribuição gratuita: 251
  • Kw gerados e consumidos com energia solar: 0.2Kw

Numerologia: Hotsite com informações sobre nossos números mensais/anuais 🔮
https://monstrodosmares.com.br/numerologia

AnarchySF: um repositório de ficção científica anarquista

AnarchySF é um catálogo online que faz a intersecção entre anarquia e ficção científica. O site é um repositório de código aberto para ficção científica anarquista e/ou de inspiração anárquica. Estão em destaque muitos livros, filmes e outras mídias que são evidentemente anarquistas em sua forma política ou de interesse para anarquistas e pesquisas de referência.

O acervo foi inicialmente coletado e organizado por Ben Beck (professor de história aposentado e escritor), que localizou e manteve o material por cerca de três décadas. No final de 2019 a coleção foi reorganizada e recebeu um novo visual pelos novos chegados do projeto, Eden Kupermintz (crítico musical de metal extremo) e Yanai Sened (que prefere fazer mistério sobre sua identidade).

Durante o processo de reorganização, a missão básica foi de torná-la muito próxima de como ele se manteve durante os últimos 30 anos. Nas palavras do próprio Ben, curador original do acervo:

“Ficção Científica é inevitavelmente o gênero mais adequado para uma reflexão sobre o anarquismo, especulações sobre como pode ser o futuro, mesmo as utopias e as distopias na ficção por vezes ocupam um espaço de “subgênero” da ficção científica. Como sabemos, faz tempo que a ficção científica atrai anarquistas.

Também existe uma tendência muito natural de se olhar para o espaço e a exploração espacial como uma metáfora para a liberdade tão querida por anarquistas. Mas isso não quer dizer que a ficção científica seja em si essencialmente anarquista. O site procura apenas investigar o quanto a ficção científica tem sido criada por anarquistas e simpatizantes da anarquia, como tem sido tema de análise da crítica anarquista, ou de fato atacada por essa crítica.

A coleção é apenas uma visão anarquista da ficção científica, se você quiser.”

O objetivo do site, desde a sua reconstrução, é utilizar ferramentas modernas de gerenciamento de conteúdos para incentivar a participação da comunidade em torno do acervo e colaborar em sua manutenção. Ninguém conseguiria mantê-lo atualizado e preciso por muito tempo; além disso, esse não seria um “modo propriamente anarquista” de se fazer as coisas. Contando com os princípios da ajuda mútua, AnarchySF convida as pessoas para ajudar a manter o acervo. É possível acessar um guia de colaboração para saber como é possível se envolver no projeto.

Por que AnarchySF é anarquista?

Naturalmente o projeto tem uma essência anárquica. Para alguns dos colaboradores e mantenedores do site, o anarquismo pode ser uma perspectiva política ou um modo de vida. No entanto, nem todas as pessoas que mantêm ou contribuem para o projeto precisam ser, necessariamente, anarquistas; geralmente, anarquistas podem ser reconhecidas em muitas cores e não cabe ao projeto criar ainda mais distinções de ideias. Em vez disso, este acervo vê a anarquia como um objeto a ser descoberto, uma ideia a ser estudada. O projeto deseja ser um repositório de conhecimento para todas as pessoas interessadas na anarquia, independentemente de sua afiliação ou identificação política.

Conheça AnarchySF: www.anarchysf.com

Julho de 2020: Agradecimentos Rede de Apoio (Podcast bônus)

Tem dias mais difíceis, nos quais as preocupações estão além das necessidades de tinta, papel e textos. Ao pensar em questões como justiça social e segurança sanitária dos centros urbanos, das periferias e da vida no campo, refletimos sobre o que está acontecendo. Quem dirá sobre o que virá?

A pandemia está ensinando muitas lições sobre como encaramos a vida, as atividades diárias, nossa convivência com as pessoas próximas e a importância de saber “habitar nossas casas”. Uma questão que bateu forte aqui é a dúvida em torno da necessidade de sermos pessoas produtivas diante de um cenário tão adverso como o da doença que dominou o mundo. Por isso estamos fazendo como o velho marinheiro, que durante o nevoeiro leva o barco devagar.

Podcast bônus

No dia 17 de Julho de 2020, Baderna James e abobrinha gravaram sobre suas atividades na editora, diagramação de livros e zines utilizando software livre (LibreOffice e GIMP) e sobre a obrigatoriedade de sermos pessoas produtivas.

Queremos agradecer as pessoas que estão conosco diariamente e que confiam em nosso projeto editorial. Algumas delas fortalecem com os recursos para manter a editora em funcionamento. Com muito carinho agradecemos as amizades da Rede de Apoio:

  • Contribuições anônimas;
  • Gabriel Jung do Amaral;
  • Mayumi Horibe;
  • Phanta;
  • Lua Clara Jacira;
  • Leo Foletto;
  • Viviane Kelly Silva;
  • Ricardo Mayer;
  • Willian Aust;
  • Enguia;
  • Fernando Silva e Silva;
  • Mauricio Marin;
  • Adriano Gatti Mesquita Cavalcanti;
  • Andressa França Arellano;
  • Eduardo Salazar Miranda da Conceição Mattos;
  • Anna Karina;
  • Victor Hugo de Oliveira;
  • Zé;
  • Karine Tressler;
  • Andrei Cerentini;
  • Lupi;
  • Caio;
  • Fyb C;
  • José Antônio de Castro Cavalcanti;
  • Guapo.

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Zapatistas: lições de auto-organização comunitária

A primeira intenção de acabar com a política e substitui-la pela justiça transformadora baseada na comunidade está em andamento nos E.U.A., mas existem comunidades que têm experimentado a auto-organização, como os Zapatistas em Chiapas.

À medida em que a pandemia de Covid-19 sufoca os sistemas de saúde e as economias, inclusive nas nações mais avançadas, as redes mútuas e os esforços de auto-organização têm surgido em todo mundo como amostra de solidariedade pandêmica.

Com o assassinato policial de George Floyd, E.U.A., vê-se uma expansão da auto-organização: de doações e fundos de ajuda mútua para manifestantes até patrulhas cidadãs em Mineápolis e uma zona autônoma livre de política em Seattle.

A partir do caso Floyd, a primeira intenção de abolir a polícia e acabar com a política, e substitui-las pela justiça transformadora baseada na comunidade está em andamento nos E.U.A., mas existem comunidade que têm experimentado a auto-organização sem recorrer aos estados que as oprimem ou espoliam, como Rojava no noroeste da Síria, Cooperação Jackson no Mississippi e Zapatistas em Chiapas.

Os zapatistas, em particular, têm passado os últimos 20 anos organizando suas comunidades de maneira autônoma em relação ao Estado em todas as esferas da vida, desde a política e o sistema de justiça até a atenção médica, a economia e a educação. À medida que somos testemunhas dos limites do que se pode mudar radicalmente, a experiência zapatista é mais relevante do que nunca.

Sendo aprendiz de novas formas de democracia direta e autogoverno apátrida, viajei para Chiapas em dezembro passado para participar de um programa de um mês, chamado “Celebração da Vida”, que culminou com a celebração do 26º aniversário do levante Zapatista de 1994, quando campesinos indígenas de Chiapas se organizaram para defender seus direitos e terras contra o Estado e os grandes proprietários.

Embasando-me na investigação etnográfica existente, assim como em minhas próprias entrevistas e conversas durante a viagem, exploro neste texto as características mais instrutivas da organização social dos zapatistas: tomada de decisões de baixo para cima, justiça autônoma, educação, sistemas de saúde e economia cooperativa, com a esperança de que possamos nos beneficiar da experiência deles ao construir nosso próprio “outro mundo”.

As pessoas decidem

Nos 26 anos posteriores ao levantamento inicial, os zapatistas se converteram em uma voz de destaque dos povos indígenas de México e construíram um sistema autônomo de fato de autogoverno em territórios contíguos ao estado de Chiapas, habitados pelos defensores do movimento.

Um princípio-chave subjacente no projeto zapatista, que assegura que as instituições autônomas sirvam às pessoas, é “mandar obedecendo”, o que significa liderar obedecendo. Isso implica que os líderes políticos não tomam decisões em nome de sua comunidade como seus representantes, mas atuam como delegados da comunidade, implementando as decisões tomadas nas assembleias locais, um mecanismo tradicional de tomada de decisões.

Representantes existem no nível da aldeia e, diferente das assembleias tradicionais do México, incluem mulheres, cujo empoderamento está no centro da revolução zapatista. As assembleias elegem delegados por um conselho municipal, e seguem no nível da estrutura zapatista.

Logo, em nível regional, vários autônomos são representados por delegados em Juntas de Bom Governo (JBG), o Conselho de Bom Governo, chamados assim em contraste com o ‘mau’ governo mexicano. Os membros da JBG servem durante 3 anos de forma rotativa, em turnos de apenas algumas semanas. Essa rotação frequentemente se destina a prevenir o aparecimento de redes de clientelismo.

O mapa é cortesia de Maël Lhopital, voluntario do DESMI.

Qualquer ideia proposta em um nível administrativo superior passa pelo processo de consulta com cada comunidade, e após isso é que cada delegado leva a opinião de suas comunidades para a reunião municipal. Há uma forte ênfase na tomada de decisões por consenso, mesmo que isso signifique, constantemente, assistir a reuniões de um dia em que todos devem ser escutados, e que as decisões não aconteçam até que se chegue ao entendimento geral.

Os líderes são eleitos de acordo com o peso da tradição indígena, a obrigação de servir à comunidade, e se comprometem a postos de responsabilidades não-remunerados. As comunidades têm direito de revogar o mandato daqueles funcionários que não cumpram com seu dever de servir às pessoas.

A formação político-militar EZLN (Exército Zapatistas de Libertação Nacional), que se organizou clandestinamente em 1983 e alcançou o levante de 1994 e as ocupações de terras, existe paralelamente aos três níveis de administração autônoma e da direção política do movimento. Bem organizado hierarquicamente, seu corpo mais alto é formado por civis eleitos por assembleias comunitárias. Além disso, sua presença nos assuntos comunitários é limitada para garantir um verdadeiro autogoverno democrático das comunidades zapatistas.

O subcomandante Moisés fazendo uma declaração na celebração de aniversário, rodeado pelo resto da CCRI-CG, o corpo mais alto do EZLN (Comitê Clandestino Revolucionário Indígena – Comando Geral) | Foto: Anya Briy

Após adotar uma posição de rechaço a qualquer ajuda do chamado governo ‘mau’, os zapatistas assumiram a função estatal de prestação de serviços nas comunidades afiliadas ao movimento. Isso significa construir seus próprios sistemas comunitários de justiça, educação, saúde e produção.

Sistema de justiça

O sistema de justiça zapatista tem ganhado confiança e legitimidade, incluindo para além dos partidários do movimento. É gratuito, acontece nas línguas indígenas e é comprovadamente menos corrupto ou parcial em comparação com as instituições governamentais de justiça. Há, ainda, o que tem de mais importante: adota um enfoque restaurador, no lugar do punitivo, e coloca ênfase na necessidade de encontrar uma solução que satisfaça todas as partes.

Dentro da comunidade, o sistema possui três níveis: o primeiro nível se refere a questões entre os partidários zapatistas, como fofocas, roubos, embriaguez ou disputas domésticas. Tais casos são resolvidos pelas autoridades eleitas ou, se necessário, pela assembleia comunal, segunda a prática habitual. Ao resolver conflitos, as autoridades funcionam, em grande medida, como mediadoras, propondo soluções às partes envolvidas. Se não conseguem resolver, os casos passam, então, ao nível seguinte, municipal, no qual são tratados por uma Comissão de Honra e Justiça eleita.

Na maioria das vezes, as sentenças envolvem serviços voluntários ou multas; as penas de cárcere normalmente não excedem alguns dias. Como Melissa Forbis explica, o cárcere comunitário geralmente é apenas uma casa cercada com uma porta parcialmente aberta para que as pessoas possam passar para conversar e trazer comida. Quando quem cometeu a infração não tem meios e precisa pedir dinheiro emprestado aos membros de sua família para pagar uma sanção, estes também estão envolvidos e a prisão ajuda a prevenir uma transgressão maior. As questões domésticas relacionadas com as mulheres são abordadas pelas mulheres na Comissão.

Maria Mora oferece um retrato revelador do enfoque do movimento sobre a punição, documentando um caso em que os zapatistas emitiram uma sentença de serviço comunitário durante um ano por roubo. Aos declarados culpados permitiu-se oscilar entre o serviço com o trabalho em seus próprios campos de milho para que suas famílias não tivessem que compartilhar o castigo. A comissão explicou sua decisão da seguinte maneira:

“Pensamos que se simplesmente os prendêssemos, os que realmente sofreriam seriam os membros da família. Os culpados simplesmente descansariam todos os dias na prisão e aumentariam de peso, mas suas famílias precisariam trabalhar no milharal e descobrir como sobreviver.”

O nível mais alto do sistema de justiça, o JBG, se ocupa de casos que envolvem principalmente não-zapatistas ou outras organizações políticas locais, geralmente sobre disputas de terra, assim como as autoridades governamentais locais. Os não-zapatistas buscam o sistema de justiça autônomo não apenas quando têm disputas com membros das comunidades zapatistas, mas também quando experimentam um tratamento injusto por parte dos funcionários do governo; neste caso, os zapatistas podem decidir acompanhar os demandantes ao escritório público e debater em seu nome.

Embora os zapatistas tenham polícia, ela é bastante diferente de como estamos acostumados a pensar nisso. Como documenta Paulina Fernández Christlieb, não são armados, nem uniformizados, nem profissionais. Igual a outras autoridades, a polícia é eleita por sua comunidade; não são remunerados e não servem nesta função permanentemente. Cada comunidade tem sua própria polícia, enquanto nos níveis administrativos mais altos, os do município e da região, não têm. Descentralizados e desprofissionalizados, os policiais servem e estão sob o controle da comunidade que os elege.

Festival de dança que faz parte do longo programa do mês, chamado de “Celebração da Vida: membros da comunidade Zapatista comemoram a vida depois de 1994. As placas falam, “Educação”, “Saúde” e “Trabalho Coletivo”. Foto: Anya Briy

Educação

O sistema educativo zapatista está igualmente enraizado na comunidade. As escolas autônomas são administradas pelos chamados “promotores da educação”, principalmente jovens locais que ensinam em suas próprias comunidades sob a supervisão de um comitê educacional eleito por uma assembleia local.

Desde o lançamento do sistema educativo autônomo, os zapatistas têm levado a cabo programas de capacitação para preparar os promotores educativos e desenvolver um plano de estudos em colaboração com grupos solidários, ONGs e voluntários de fora, assim como em consulta com a população local. Atualmente as comunidades têm seus próprios profissionais que capacitam novos promotores. Assim como outros postos de autoridade e responsabilidade, os promotores não recebem salários e a comunidade apenas os ajuda no cultivo de seus campos de milho.

O plano de estudos está integrado na vida da comunidade e é desenhado para preparar uma nova geração para as tarefas de governança e autossuficiência, que incluem temas como autonomia, história, agroecologia e medicina veterinária. As aulas são ministradas tanto em espanhol quanto nas línguas indígenas, com ênfase na preservação das tradições e conhecimentos locais. A comunidade participa ativamente da escolha da metodologia e do plano de estudos, como mostra o comentário de um promotor de educação de uma das comunidades, citado por Bruno Baronnet:

“Consultamos o nosso comitê de educação e nossa assembleia sobre os verdadeiros conhecimentos que são importantes para nosso povo. São as pessoas que decidem e respeitamos suas opiniões, inclusive se as vezes não estou de acordo, como no outro dia durante a assembleia, quando me pediram que eu não jogasse com as crianças durante as horas de escola porque alguns pais pensam que não se podem aprender enquanto se divertem. Não sabia como dizer a eles que não estão de todo certo, mas os convencerei na próxima vez. (Tradução da autora, do Francês).”

Os jovens zapatistas estão representando suas vidas antes de 1994, fingindo beber cerveja e segurando um cartaz com o nome de um recente programa de ajuda governamental, Sembrando Vida.

Cuidados com a saúde

Os zapatistas também têm desenvolvido seu próprio sistema de saúde, enquanto ainda se utilizando da ajuda de especialistas não-zapatistas. A maioria das comunidades tem um voluntário local, um promotor de saúde, que recebe capacitação em medicina tradicional e moderna nos centros de saúde regionais organizados pelos zapatistas. Estes voluntários prestam serviços básicos em uma casa de saúde local.

O tratamento mais avançado disponível está nas clínicas localizadas em travessias de caminhos e em alguns centros municipais. A clínica em Oventic, por exemplo, é uma das mais sofisticadas: oferece cirurgia básica regular, atendimentos dentários, ginecológicos e oftalmológicos, abriga um laboratório, um canteiro de ervas, uma dúzia de leitos e está equipada com ambulâncias. Os comitês de coordenação de saúde, igual aos de educação, existem em cada nível administrativo, o que garante a participação das comunidades na administração do sistema de saúde autônomo.

Mulheres zapatistas que saíam de uma clínica localizada no centro de Morelia, onde se realizou o encontro internacional de mulheres, que também faz parte do programa de um mês e o aniversário. | Foto: Anya Briy

Nas comunidades mistas, onde os zapatistas coexistem com os não-zapatistas, os serviços autônomos estão abertos a todos. Me disseram, por exemplo, que pais não-zapatistas enviaram seus filhos para as escolas autônomas porque sabem que são de melhor qualidade. A mesma coisa se aplica às clínicas zapatistas, já que a falta de médicos nas comunidades indígenas é comum.

Produção: Para Todos Tudo, Para Nós Nada

O funcionamento do governo autônomo, escolas e clínicas, assim como de outros projetos coletivos, são financiados por meio do ingresso em cooperativas e coletivos de terras. Eles estão no centro da inspiração zapatistas de alcançar a autossuficiência econômica do Estado e construir uma economia baseada na distribuição equitativa dos recursos.

Embora as cooperativas e os coletivos coexistam com os terrenos familiares e o empreendimento individual, a participação no trabalho coletivo acontece de forma rotativa e é obrigatória. Também existem os bancos populares em forma de fundos rotativos que concedem empréstimos a baixo interesse aos membros da comunidade como base de apoio. Esses bancos geram fundos que se convertem em novos projetos coletivos. Alguns projetos coletivos são apenas para mulheres e têm a intenção de criar uma oportunidade para que elas ganhem confiança e participem da vida social de suas comunidades.

María, membro de uma comunidade zapatista, compartilhou sua experiência e compreensão sobre muitos aspectos da luta zapatista, incluindo o compromisso com o trabalho coletivo. | Foto: Anya Briy

Outro mundo é possível

Os desafios que o movimento zapatista enfrenta são muitos. Vão desde desertores, resultado da campanha de cooptação do governo por meio de subsídios e programas de melhoria, até a dependência financeira do financiamento por parte de ONGs solidárias e a persistência de tendências patriarcais e desigualdades internas.

Sem dúvida, apesar dos desafios, em 26 anos de luta pela autonomia, os zapatistas têm construído acordos sociais funcionais baseados na democracia debaixo para cima, cooperação e justiça comunitária, que colocam o bem estar da comunidade acima do benefício individual.

Através desses acordos, as comunidades zapatistas têm assegurado os direitos, a proteção e as necessidades básicas que o Estado mexicano tem lhes negado ou não pôde lhes proporcionar. Como assinalou recentemente Dora Roblero de Frayba, uma organização que vem acompanhando os zapatistas desde o princípio, os zapatistas podem ser a única comunidade no México mais preparada para resistir à pandemia, graças a sua auto-organização de serviços básicos durante anos.

Sabendo que os Estados não protegem e nem promovem serviços para tantos cidadãos em todo o mundo, a experiência zapatista oferece uma alternativa inspiradora centrada na comunidade.


Por Anya Briy, publicado em OpenDemocracy e traduzido por Ste.

O panorama atual do livro anarquista. Passeando entre editoras

Forma parte da tradição libertária, talvez de uma maneira central, o interesse pela difusão de suas ideias. Ao largo da existência do que poderia se chamar de movimento anarquista (com todas as aspas que queiram), existiram certos grupos dedicados a impressão de textos próprios ou traduzidos, assim como uma infinidade de revistas e publicações mais ou menos periódicas.

Distantes estão os tempos em que o número de exemplares se contava aos milhares (vale como exemplo o livreto Doze provas da inexistência de Deus, de Sebastian Faure, que teve uma edição de 620.000 exemplares em 1917 ou os 560.000 de Entre Campesinos, de Errico Malatesta, segundo cifras de J. Álvarez Junco), mas é um fato a vinculação do mundo editorial e o anarquismo. Figuras como Anselmo Lorenzo, Fermím Salvochea, Ricardo Mella ou Diego Abad de Santillán dedicaram esforços à edição e tradução de obras. Essa tradição editorial teve nos anos 70 e 80 uma continuidade, incluso por editoras estritamente libertárias, que aproveitaram o nicho de ideias para editar textos, como foi o caso da série Acracia, de Tusquets.

Nos últimos anos, entre outros motivos, por certo despertar de interesse acerca de temas sociais, estendeu-se por toda a Península uma interessante forma de se aproximar da cultura libertária: os encontros do livro anarquista. Salamanca, Barcelona, Madrid, Sevilla, Valência, Bilbao, Cartagena, Zaragoza, Gijón, Logroño, entre outras, são cidades em que esse tipo de evento já se celebra. Esses encontros servem para difundir o ideal anarquista tanto no âmbito oral, com conversas e colóquios, como por escrito, reunindo diferentes projetos dedicados ao mundo do livro e do fanzine.

Em paralelo ao crescimento e consolidação de muitos encontros ou feiras do livro anarquista, como evidente contraponto as feiras comerciais, parece também que se expandem e se consolidam diversos projetos editoriais ligados ao mundo libertário.

A cultura anarquista ocupa um lugar de permanente confrontação com a cultura hegemônica atual, porque frequentemente vive nas margens do sistema. Quando falamos das margens do sistema, queremos falar de como existem formas culturais que transitam com tensão ou que fogem com maior ou menor êxito da voracidade cultural da mercadoria. Dentro deste panorama, como não poderia ser diferente no mundo anarquista, a variedade se amplia.

Para algumas pessoas, a cultura anarquista é aquele que reflete as lutas, os personagens, as ideias, etc, associadas ao anarquismo no passado, presente e futuro. Isso pode se fazer desde diferentes modelos organizativos, entre os quais existam aqueles que defendam que o livro não é, única e exclusivamente, seu conteúdo. Para esta posição, o livro também é o seu modo de circulação. Assim, um livro seria como uma pessoa, que é seu conteúdo, suas palavras e seus atos, sendo esse modo de circulação do qual falamos. As palavras tem um conteúdo informativo, ou seja, as palavras fazem a realidade, ou se preferirmos, influencia nela. Seguindo esse raciocínio, se um livro diz coisas racistas, estaria se convertendo em parte do sistema de dominação (racial) e, por exemplo, se um livro é vendido em uma livraria onde seus trabalhadores/as têm condições laborais miseráveis, esse livro se impregnaria dessas circunstâncias, pois parte de seu preço se converteria em mais-valia (em síntese: em benefício para o explorador).

Essa postura convive com outras, seguindo múltiplos debates no cotidiano a partir de possíveis matizes que surgem no desenvolvimento da atividade cultural, nesse caso, editorial. Esses debates se movem entra a atividade editorial militante (que representariam as ideias explicadas) e as editoriais como cooperativas autogestionárias ou projetos de auto-emprego, entre uma atividade ao mais puro estilo Do It Yourself, ou mais ou menos profissionalizada. Em uma ou outra posição, sempre com firme caráter assembleário e autogestionário, se constituem vários projetos editoriais cujas diferenças também se relacionam com a preferência por tratar de temas variados ou girar ao redor de determinados temas específicos. Exemplo claro disso são os editoriais como o Ochodosquatro, que se dedica a divulgação de textos relacionados aos direitos dos animais, ou o El Salmón, que edita trabalhos que analisam como a tecnologia se insere no sistema de dominação. Não é raro que existam editoriais que sejam ao mesmo tempo livrarias ou livrarias que tenham seu próprio projeto editorial. Em Madrid já é veterana a livraria e editorial La Malatesta (e recém-nascida como La Rosa Negra) e em Barcelona se pode encontrar, nesse sentido, a Aldarull (e com parecido espírito temos também a El Lokal). Em Granada, a livraria Bakakai edita sob nomes diferentes, enquanto que nessa mesma cidade a Biblioteca Social Hermanos Quero, com o seu próprio nome, colabora com frequência com outros projetos para publica r livros sobre antipsiquiatria ou contrapsicologia, urbanismo, etc.

Já que nos metemos na infame tarefa de etiquetar editoras, há de se destacar que algumas tem especial interesse por textos mais clássicos, como a já mencionada La Malatesta, enquanto que outras se concentram principalmente na edição de ensaios mais contemporâneos, como a editora Vírus, ou a Muturreko Burutazioak, ou também, de forma exclusiva em textos atuais que analisam as últimas décadas do século XX até os dias de hoje, como a editora Klinamen. Não obstante, provavelmente sejam mais frequentes as editoras que utilizam em suas edições critérios não cronológicos, visto que se pode encontrar em seus catálogos textos de qualquer época, como os das editoras Deskontrol, Diaclasa, Calumnia, El Grillo Libertario, El Imperdible ou Piedra Papel Libros, entre muitos outros exemplos possíveis. A maioria das mencionadas (Diaclasa, El Imperdible e também Madre Tierra ou Ediciones Marginales) dedicam-se exclusivamente (ou quase) ao gênero literário ensaístico, se bem que existam outras que possuam em seus catálogos obras de outros gêneros literários (como Piedra Papel Libros em poesia e a Volapük em narrativa).

Simplificando de maneira um pouco insultante, podemos dizer que é possível a divisão do mundo editorial convencional entre as grandes empresas editoriais que funcionam como qualquer outra multinacional: é a grande indústria cultural como o Grupo Penguin Random House (Plaza y Janés, Debolsillo, Taurus, etc.) ou o Grupo Planeta (Espasa, Paidós, Ariel, etc.), e aquelas outras, poucas e pequenas quando comparadas com as outras, que se aferram à Cultura, com catálogos muito caprichados como Akal. Também podemos falar de um terceiro grupo de editoras alternativas por seu tamanho, como a Nórdica Libros, Errata Naturae ou a Impedimenta.

As primeiras buscam essencialmente dinheiro, em que pese o que poderia aparentar a complexa política de diversificação entre coleções de consumo massivo e outras de caráter acadêmico ou de altos voos culturais; as outras amam, apreciam a alta cultura porque acreditam, de forma implícita, que um “mundo mais culto” é um mundo melhor.

O mundo anarquista coincide com a desprezível grande indústria editorial em um aspecto. Frente as editoras que mimam seus catálogos com grandes pensadores ou pensadoras, e não sentem a cultura, como frequentemente fazem os artistas, como um fim em si mesmo, os livros anarquistas, de outro lado, são ferramentas para conscientizar, agitar e isso supõe que muitos livros anarquistas não saem de um grupo de pessoas que se dedica com exclusividade às atividades editorais, mas que os fazem como atividade cultural secundária ou pontual. Assim encontramos que a CNT tem uma fundação (Fundação Anselmo Lorenzo), dedicada a publicar livros sobre seus militantes e sua história, marginalizados pelos cronistas acadêmicos, ou que o já veterano Espaço Anarquista Magdalena no madrilenho bairro de Lavapiés publicou pontualmente ou colaborou com a edição de diversos textos.

Por outra parte, o mundo editorial anarquista, ao entender o livro como uma ferramenta a serviço da transformação social libertária, aposta tradicionalmente por valorizar a mensagem por cima da forma. Por isso, não é raro que o formato seja extremamente simples, inclusive, às vezes, muito mais simplório ante os estandartes comerciais. Para quem está acostumado ao mundo editorial convencional, pode ter uma impressão negativa, mas a realidade é que o processo, que nesses tempos relacionamos com o DIY, significa uma desconstrução da hierarquia do processo cultural editorial, ao abrir esse mundo para quase qualquer pessoa, ou grupo de pessoas que pretendam colocar no papel o que seja. Dessa maneira, existe uma débil barreira entre aqueles que difundem e editam textos anarquistas e seus leitores/as, de forma que passar de um lado para outro é tremendamente habitual, o que confere um caráter popular e horizontal ao mundo cultural libertário como é impossível de se imaginar na indústria cultural capitalista.

Isso se observa principalmente no mundo do fanzine, que usualmente aparece nas ruas ou em espaços diversos através de distribuidoras (que é o nome que lhe dá o movimento anarquista ao projeto de uma ou várias pessoas que publicam e vendem, ou só vendem, ou trocam, textos libertários por sua conta e risco, ou como parte de um projeto mais amplo como pode ser, por exemplo, um centro social), que se contam em dezenas, quiçá centenas, construindo provavelmente a parte quantitativa mais importante do mundo editorial anarquista.

É evidente que o campo editorial libertário serviu de inspiração para pessoas que não se identificam com o corpus geral de suas ideias ou práticas, mas que valorizam e integram muitos outros aspectos do mundo libertário: sua vocação anticapitalista, sua mensagem de ruptura, sua organização autogestionária, a pretensão de fazer coerentes os meios para alcançar um objetivo como próprio objetivo, etc. isso faz com que existam editoriais cujos vínculos com o movimento anarquista sejam difíceis de elucidar. Para além disso, um mundo descentralizado e focado em um aqui e agora de projetos que vem e vão em sua pretensão de mudar o mundo, resulta inalcançável para nossas possibilidades, razão pela qual muitos nomes, seguramente muito interessantes, meritórios e comprometidos caíram no caminho.

Por outro lado, valha este escrito para uma aproximação com o intenso trabalho de difusão cultural como forma de crítica social que mantém os anarquistas, frequentemente contra o vento e as mares.

Por outra parte, os esquecimentos tem fácil solução: esta página* tem a opção de acrescentar comentários para que recordemos esses projetos. Uma maneira de dar a conhecer aquelas editoras que acabamos por esquecer ou que não podemos incluir por limitação de espaço.

La Neurosis o Las Barricadas Ed.

* Se refere a página do ‘Solidaridad Obrera’, publicação que dá foz a CNT-AIT Catalunya-Balears, onde este texto foi publicado originalmente em 22 de março de 2017.

Fonte: http://www.laneurosis.net/el-panorama-actual-del-libro-anarquista-buceando-entre-editoriales/

Tradução > Liberto
Links e modificações por Vertov.

Publicado em Agência de Notícias Anarquistas

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